Obrigado Rui, a invasão de Timor leste foi outra página negra na história.
Timor Leste, uma história de atrocidades e submissão
A tragédia que se abateu sobre a população timorense tem mais a ver com a sociedade brasileira do que possa parecer à primeira vista. O Timor e o Brasil foram incorporados à geografia, à história e à economia do ocidente no mesmo processo de expansão marítima e comercial européia que se desenvolveu entre os séculos XV e XVI. Como nós, aquele povo insular foi objeto da colonização portuguesa, a qual, com todas as suas mazelas, nos legou a ambos a mesma língua, que hoje é falada por cerca de 20% dos timorenses e adotada como idioma oficial da luta de resistência. Outro fator de identificação é a religião católica, alvo da devoção de 92% dos habitantes do Timor, o que os torna o povo mais católico do continente asiático.
A ilha do Timor fez sua primeira aparição num mapa ocidental no ano de 1512. Localizada pelos portugueses a caminho de sua feitoria de Málaca (atual Malásia), recebeu destes a denominação de "a ilha onde nasce o sândalo". Entusiasmados com as propriedades perfunctórias da referida madeira, desde então uma matéria-prima bastante cobiçada para a elaboração de perfumes, ungüentos e incensos, navegantes e mercadores lusitanos para ali se dirigiram em diversas expedições comerciais entre os anos de 1514 e 1520. Já nessa época o Timor era dividido em dois reinos, Samby, na parte oeste da ilha e Behale, no leste.
Em 1561, missionários dominicanos implantaram um núcleo de evangelização na ilha adjacente de Solor, o qual seria fortificado cinco anos depois, e, já em 1595, estes religiosos haviam expandido suas atividades até a ilha de Ende Minor, na costa sul de Timor.
Ocorre que, em 1613, destacamentos flamengos a serviço da Companhia Holandesa das Índias Orientais se apoderaram do forte de Solor, forçando os religiosos portugueses a se transferirem para a localidade vizinha de Larantuka (Ilha das Flores). As décadas seguintes registraram uma intensificação da escalada holandesa na região, obrigando os portugueses a consolidarem militarmente sua presença na ilha de Timor, o que levou à fundação da cidade de Dili, atual capital do Timor Oriental, no ano de 1668, e finalmente, no ano de 1702, foi nomeado o primeiro governador português da ilha de Timor, Antônio Coelho Guerreiro. Este fato permitiu a Portugal um controle definitivo da parte oriental da ilha, tendo sido firmado um acordo com a Holanda em 1859 que determinou a partilha do território em duas partes: a ocidental, sob controle holandês e a oriental, sob administração portuguesa.
Em 1903 um australiano descobriu a existência de petróleo na costa. No final da I Guerra Mundial, o Japão tentou comprar o Timor, oferecendo uma boa soma, o que foi oficialmente rejeitado por Salazar em 1932. O regime salazarista considerava os timorenses como "uma das raças degeneradas e atrasadas" das colônias, o que serviu de pretexto para retirar os direitos cívicos, ainda que mínimos, que tinham adquirido em 1822.
Território estratégico, entre a Austrália, Indonésia, Filipinas, dando acesso à China, o Timor foi invadido durante a II Guerra Mundial, primeiro pelos australianos, que pretendiam organizar uma resistência no território, em seguida pelos japoneses, que criaram campos de concentração, cometeram atrocidades em larga escala e deixaram 60.000 mortos.
O Timor saiu da II Guerra Mundial praticamente arrasado, mas Portugal continuou não investindo na colônia, preferindo Macau, mais lucrativa. Para o Timor, que produzia basicamente café - considerado um dos melhores do mundo - eram mandados os prisioneiros políticos e dissidentes do salazarismo.
Em 1975, tropas indonésias invadiram o Timor Leste, aproveitando a indefinição gerada pela retirada de Portugal, que até então administrava a ilha como uma colônia. A invasão ocorreu após uma breve guerra civil, onde a Frente Revolucionária do Timor Leste Independente (Fretilin), de esquerda, derrotou as forças conservadoras locais, que queriam a integração com a Indonésia. A Fretilin chegou a proclamar a independência em novembro de 1975, mas foi forçada a abandonar a capital, Dili, bombardeada pela aviação indonésia.
Em julho de 1976, Timor Leste foi declarado oficialmente a 27ª província indonésia, passando a se chamar Loro Sae, apesar das sucessivas resoluções da ONU - que considerava ilegal a ocupação - exigindo a retirada dos invasores e a autodeterminação dos timorenses.
A conquista e posterior ocupação do Timor Lorosae pela Indonésia constitui um dos piores massacres perpetrados ao longo do século XX. Apenas nos primeiros meses de ocupação, perderam a vida cerca de 60.000 insulares, aproximadamente o mesmo número de vítimas provocadas por três anos de dominação japonesa, um número, proporcionalmente falando, superior ao total de perdas humanas sofridas pela União Soviética durante a Segunda Guerra Mundial. Nos 24 anos de subordinação à Indonésia, foram sacrificadas cerca de 200.000 pessoas, um quarto da atual população timorense.
Tais números apenas ratificam a eficiência homicida que caracterizou a ditadura de Suharto, estabelecida na seqüência de um golpe militar contra o Presidente Sukarno - expressiva personalidade do Terceiro Mundo e líder do movimento não alinhado -, no curso da qual foram assassinados cerca de 800.000 indonésios, em sua maioria integrantes do PKI, na época o maior partido comunista fora do poder em todo o mundo.
No dia 31 de dezembro de 1978 o exército indonésio matou Nicolau Lobato, o líder da resistência e comandante das Fretilin. Começa então a liderança de um de seus companheiros, José Alexandre Gusmão, conhecido na guerrilha como Ray Kala Xanana. Ele vai transformar as Fretilin numa frente ampla de resistência a partir de 1987 e, no ano seguinte, criar o CNRT, o Conselho Nacional da Resistência Timorense, que reúne todos os partidos. Em novembro de 1991 Xanana Gusmão é preso em Dili e levado para Jacarta, onde é condenado à prisão perpétua, em 23 de maio de 1993 num julgamento considerado uma farsa por observadores estrangeiros.
Em 1996, o Prêmio Nobel da Paz foi dado a dois líderes da luta pela independência do Timor: o bispo dom Carlos Felipe Ximenes Belo e o porta-voz do movimento, José Ramos Horta, fazendo com que o conflito no Timor Leste voltasse a ser lembrado pelo mundo.
Mas, apesar da truculência e da crueldade da ditadura indonésia e da cumplicidade dos governos democráticos do ocidente, a ditadura de Suharto veio abaixo somente no caudal da grave crise econômica que sacudiu os países asiáticos. Ele renunciou em 21 de maio de 1998, assumindo em seu lugar Yusuf Habibie.
