3 BLINDADOS
3.1 Origens
O combate em vantagem de posição, isto é, uma forma de lutar em que se tenha superioridade em relação ao inimigo, sempre foi idéia fixa dos exércitos, desde que a primeira batalha foi travada. Tal vantagem era obtida utilizando-se plataformas empurradas, montando-se em elefantes ou, como se consagrou posteriormente, montando-se cavalos.
O aparecimento das armas de fogo e a sua utilização em massa vieram a inabilitar o uso do cavalo para o combate, fato decisoriamente comprovado ao rugir das primeiras metralhadoras. Nisso já estamos nos estertores do século XIX, e parecia que a técnica de combate em vantagem de posição estava fadada ao ostracismo.
3.2 Surgimento dos blindados
As causas que levaram ao deflagrar da I Guerra Mundial (I GM), em 1914, envolveram, como seu efeito, uma quantidade de meios, gastos, efetivos e quantidades de nações empenhadas nunca anteriormente registrados. Sua principal característica como conflito foi a quase impossibilidade da ofensiva, o que se convencionou chamar de guerra de posição.
Em 1916 o combate havia chegado a um impasse que nenhum dos contendores havia podido imaginar. A idéia da época era de que o poder de fogo da artilharia definiria o combate, tendo sido desenvolvidos inúmeros modelos e enormes calibres de canhões e obuses, que só serviam para revolver o campo de batalha em que a infantaria chapinhava (a famosa “terra de ninguém”). As tropas se entrincheiravam ao longo de quilômetros sem um avanço decisivo. Os ataques eram rechaçados pelas metralhadoras, e o crescente número de baixas agia como fator desestimulador do moral dos combatentes. Foi quando em 1916, em 15 de setembro Batalha de SOMME, os ingleses resolveram utilizar uma arma, em caráter experimental, que já vinha sendo desenvolvida a algum tempo mas que encontrava forte
resistência perante os militares mais conservadores.
Os “tanks” (esse nome derivava do fato de que toda a documentação referente a nova arma tratava-a como se fosse um tanque para água) foram utilizados em quantidade reduzida e numa área limitada, para que pudessem ser avaliados os resultados. Apesar da debandada de diversos alemães perante a nova arma que resistia ao fogo das Mtr e passava sobre a terra de ninguém, uma boa parte dos 50 Bld utilizados não chegou ao objetivo por panes mecânicas ou por ter atolado. Naquele dia, alguns viram nisso um motivo para se abandonar o projeto, enquanto que outros, mais visionários, viram naquele momento o surgimento de uma importante arma para o combate moderno, capaz de retomar o combate em vantagem de posição da velha cavalaria. Aqueles de visão mais curta pagariam sua falta de previsão logo nos primeiros anos da II GM, quando os alemães surpreenderiam o mundo com sua guerra de movimento apoiada por uma massa de blindados (a “blitzkrieg”), varrendo um a um os inimigos. A I GM não foi vencida pelos Bld, mas testemunhou o seu nascimento como arma de combate.
3.3 Segunda Guerra Mundial
Apostando na nova arma, o exército alemão investiu não só na sua fabricação, mas também no estudo de como melhor emprega-la taticamente, o que lhe rendeu rápidas vitórias sobre aqueles que não souberam aproveitar os ensinamentos colhidos e quebrar seus paradigmas. As famosas Divisões Panzer procuravam concentrar massa e fogos num ponto fraco do inimigo previamente selecionado. Após intenso bombardeio aéreo e grandes preparações de artilharia, uma massa de Bld se concentrava no ponto fraco e rompia a defesa em ataques pelos flancos e retaguarda. Essa era a Blitzkrieg. Os aliados demoraram a aprender a repelir esses ataques, e começaram a rechaçar os alemães apoiados em sua sólida base industrial que permitiu a produção contínua e ininterrupta de enormes quantidades de Bld que sufocaram o já desgastado esforço de guerra alemão e seu arrasado parque industrial.
3.4 A Guerra Fria e a Guerra do Golfo
Uma nova era se sucedeu ao apogeu da II GM. Não foi um período de paz, mas de uma nova forma de guerra, em disputa de interesses regionais, com as nações do mundo procurando o alinhamento com uma das duas grandes nações que emergiram do último grande conflito, a URSS ou os EUA. O mundo vivia a tensão nuclear, mas os conflitos continuaram a ser decididos pelos meios convencionais, sobressaltando-se os Bld. Nas areias do Oriente Médio ocorreram grandes desenvolvimentos técnico e táticos, vindos na esteira de um sem número de conflitos regionais de natureza político-religiosa que até hoje assolam essa região.
Os maiores avanços na área dos Bld não foram de natureza tática, mas sim tecnológica. Os canhões se sofisticaram e se tornaram mais letais e precisos, a noite deixava de ser um empecilho ao combate, graças à aparelhagem de visão noturna, blindagens novas eram desenvolvidas e os parques industriais russos e americanos se esforçavam por suprirem seus exércitos e de nações amigas com equipamentos cada vez mais sofisticados. A tecnologia se tornava cada vez mais o fator decisivo da guerra.
Durante a Guerra do Golfo o mundo teve diariamente nas telas de tv a demonstração de quão sofisticada a guerra poderia se tornar. A computadorização nos equipamentos de combate chega a níveis nunca dantes alcançados, e nos Bld isso reflete em segurança para a tripulação, tiro mais preciso e letal e redução no número de baixas. Isso se conseguiu com sofisticados equipamentos manejados por tropas extremamente bem adestradas, mostrando que os Bld são definitivamente uma arma decisiva no campo de batalha moderno em qualquer parte do mundo.
3.5 Blindados no Brasil
Durante a década de 20, ainda eram poucos os exércitos do mundo a possuírem Bld. O desempenho dessa arma futurista não impressionou a maioria conservadora dos militares de sua época, e somente homens de visão futurista compreenderam os ensinamentos que essa arma traria para o futuro das operações bélicas.
O Brasil foi o país pioneiro na América Latina no emprego de blindados, devendo esse pioneirismo ser atribuído ao espírito empreendedor do Cap José Pessoa. Esse oficial lutou na I GM numa missão militar francesa, no 503o Regimento de Carros de Combate, tropa Bld, e publicou o livro ”Os tanks na guerra européia”, relatando suas experiências. Ele foi o responsável pela criação da pioneira Companhia de Carros de Assalto (1921-1932), que utilizava CC Renault franceses. Mas essa SU teve vida curta, sendo que quando o Cap José Pessoa deixou seu comando suas atividades foram diminuindo até sua extinção em 1932.
FIGURA 1 – CC RenaultFONTE – GAMA, Marcus Vinicius de Andrade. Evolução histórica dos Bld. Disponível na Internet.
http://www.geocities.com/Pentagon/1677
Após uma lacuna de praticamente 6 anos, em 1938 o Brasil adquire da Itália 23 CC Fiat ANSALDO que viriam a mobiliar a segunda Unidade Bld brasileira, o Esquadrão de Auto-Metralhadoras.
FIGURA 2 – CC FIAT ANSALDOFONTE – GAMA, Marcus Vinicius de Andrade. Evolução histórica dos Bld. Disponível na Internet.
http://www.geocities.com/Pentagon/1677
O Esqd de auto metralhadoras, comandado pelo Cap Cav Carlos de F. De Paiva Chaves, foi transformado em Subunidade – Escola de Moto-Mecanização, passando a integrar o Centro de Instrução de Motorização e Mecanização (CIMM), que deveria servir de núcleo para a formação e adestramento das tropas Bld brasileiras.Em junho de 1942 o CIMM foi transformado em Escola de Moto-Mecanização (ESMM), Na época, com o alinhamento do Brasil com os aliados, recebeu a responsabilidade de a curto prazo formar profissionais aptos a operar e manutenir os novos Bld recebidos, como o meia-lagarta,o M-8, o Lee, o Grant e o Sherman.
Com o envio de tropas para o teatro de operações europeu na II GM, a Divisão de Infantaria Expedicionária contava com a criação, em 1943, do Primeiro Esqd de Reconhecimento, constituído de carros M-8 norte-americanos e organizada de acordo com as unidades americanas de reconhecimento da época
Em 1960, com a transformação da EsMM em Escola de Material Bélico (EsMB), o ensino tático foi retirado do currículo, tornando-se uma escola de ensino técnico. Este fato gerou uma lacuna, pois nenhum estabelecimento de ensino absorveu a memória adquirida, tendo sido o ensino tático de Bld dividido e ministrado pelas escolas de formação, aperfeiçoamento e pelas unidades de tropa.
Após a II GM destacamos a compra , nos anos 60, dos CC M41, da qual participou da comissão de estudos o Cap Cav Hildo Vieira Prado, dos M113, e suas modernizações pela Bernardini. Também houve o desenvolvimento da família de blindados da ENGESA,da qual somente se concretizaram as Vtr URUTU e CASCAVEL, e cuja primeira OM a receber dotação completa foi o Primeiro R C Mec, em Itaqui-RS.
FIGURA 3 – VBR CASCAVELFONTE - AUTOR FIGURA 4 – VBC M41FONTE - AUTOR
A ENGESA também participou do desenvolvimento da VBC (Vtr Bld de Combate) OSÓRIO, que sucumbiu a pressões externas. Também houve o desenvolvimento por engenheiros militares da VBTP CUTIA, e das VBTP CHARRUA e VBC TAMOYO, da Bernardini, sendo que esta última perdeu uma concorrência internacional para o TAM argentino, e nenhuma delas passou do projeto. Desse modo transcorreram os anos do pós-guerra, até que atendendo a necessidade de modernização foram comprados os CC Leopard e M60, gerando verdadeira ebulição em torno do assunto “blindados”,com o envio de oficiais ao exterior e criação de novas unidades.
Em 11 de outubro de 1996,pela portaria ministerial Nr 658, foi criado o Centro de Instrução de Blindados General Walter Pires,de cujas diretrizes de implantação depreende-se que seria um estabelecimento de ensino, instrução e adestramento para tropas Bld e Mec, com ênfase para a formação das guarnições das novas Vtr VBV M60 A3 TTS e Leopard, o adestramento de oficiais no comando de FT nível SU e o adestramento de Of e Sgt de guarnições e pelotões blindados e mecanizados.
Hoje em dia o centro é considerado verdadeiro vetor de modernidade, contribuindo para a difusão da doutrina, emprego, instrução e do adestramento dos Bld no Exército Brasileiro.
3.6 Atualidades e perspectivas para o futuro
Dentro da visão holística atual de um campo de batalha multidimensional, que se enquadre numa guerra de movimento de evoluções e desenlaces de grande velocidade, nenhum país que queira ter uma força apta para sua defesa e que tenha poder de dissuasão pode se abster de possuir Bld modernos. As tropas, para se tornarem aptas a combater nesse ambiente diversificado, precisam procurar níveis de capacitação que a habilitem a atuar em qualquer situação passível ou possível de acontecer. Para isso, há a necessidade de que possuam Bld com as seguintes características:
- sistema de estabilização de tiro
- sistemas de visão noturna e termal
- possibilidades de navegação anfíbia e transposição de vaus
- blindagens ativas e eficientes contra o uso de munições atuais
- possibilidades de defesa QBN
- possibilidades de utilização de Vtr de apoio nos mesmos chassis como PC, Vtr Mrt, lançadoras de pontes, dozzers, etc.
Como perspectivas para o futuro temos, a médio prazo, no Brasil, a aquisição da nova família de Bld sobre rodas em desenvolvimento pela Secretaria de Ciência e tecnologia (SCT), o domínio das táticas, técnicas e procedimentos que envolvam os novos CC Leopard e M60 , a aquisição de Vtr de apoio sobre lagartas para esses CC (lançadores de pontes, ,etc), e principalmente a incrementação da instrução de Bld com o aumento da utilização da simulação de diversos tipos com MAI.
FIGURA 5 – CC LEOPARD
FONTE - AUTOR
3.7 Nova família de blindados sobre rodas
Seguindo o plano básico de ciência e tecnologia, o levantamento das necessidades e formulação conceitual dos MEM (Materiais de Emprego Militar), baseado nas listas de necessidades produzidas pela diretoria gestora, foi notada a necessidade de substituição do material blindado sobre rodas atualmente em uso.Isso é feito tendo por base, quantitativa e conceitualmente, o material procurado, através de Condicionantes Doutrinárias e Operacionais (CONDOP), verificadas as necessidades operacionais futuras, o planejamento estratégico de emprego da Força Terrestre, os Quadros de Dotação de Material (QDM) e a previsão tecnológica. Essas necessidades são fixadas em termos operacionais e quantitativos, sendo cada MEM definido conceitualmente por Requisitos Operacionais Básicos (ROB), Requisitos Técnicos Básicos (RTB), Anteprojeto e Estudo de Viabilidade Técnico-Econômica (EVTE), que juntos formam os chamados elementos de definição do material.
Essa substituição deve-se à falência da firma produtora do material atualmente em uso, a ENGESA, que fornecia os Bld URUTU e CASCAVEL. Isso interrompeu o fluxo de suprimento e impossibilitou a opção de modernizações. A Secretaria de Ciência e Tecnologia (SCT) procurou então, desenvolver através do CTEx (Centro Tecnológico do Exército) uma família de Bld que atenda aos requisitos de possuir uma subfamília leve e uma média, montadas sobre uma plataforma básica que traga vantagens logísticas em manutenção, treinamento e custo.
O projeto parte da premissa de possuir grande mobilidade e permitir a utilização de variados sistemas de armas embarcados.O preço dessas Vtr é de 300.000 dólares por Vtr leve e de 1,5 milhão por Vtr média,e a necessidade levantada pelo EME é de 1200 exemplares de cada modelo para completar a dotação das Unidades.
A previsão de entrega dessas Vtr era para 2010, mas em palestra da SCT foi informado um atraso por problemas conjunturais que retardará esta data .
Há a necessidade da garantia da aquisição da quantidade de Vtr exposta anteriormente para que se viabilize a produção, evitando que ocorra com esse projeto o mesmo que a outros ( Vtr da ENGESA, Vtr CUTIA, TAMOYO, CHARRUA, etc).
A utilização de habilidades gerenciais como o estudo do ciclo de vida dos MEM, descrito na IG 20-12, aliados ao estudo dos erros do passado nos permitem uma boa perspectiva para essa nova família de Bld, atendendo todos os requisitos necessários e às expectativas da tropa. Outro detalhe importante é a necessidade de ,dentro dos modelos elaborados, a presença de alguns simuladores, como uma Viatura Bld Escola (VBE), que seriam utilizados como MAI para a formação e adestramento dos motoristas, a exemplo do que ocorre com os CC Leopard, a fim de evitar o desgaste das Vtr em uso através da simulação.