A destruição de um idioma

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JT8D
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A destruição de um idioma

#1 Mensagem por JT8D » Dom Dez 06, 2015 12:21 am

Inicio este tópico sobre um assunto que me incomoda muito. Não sei se este desconforto é compartilhado por outras pessoas. Se for de interesse geral o tópico vai prosperar, caso contrário que morra de morte natural.
O assunto que me incomoda é a carnificina que vem sofrendo o velho idioma de Camões.
Não, eu não sou um conservador nem um saudosista. Sei que o idioma é dinâmico e socialmente construído. Entretanto, nada justifica certas atrocidades. Vamos a alguns exemplos concretos para que todos possam entender do que estou falando.
Infelizmente vivemos num país de analfabetos funcionais. Não tenho nada contra essas pobres criaturas que não tiveram a oportunidade de uma educação de melhor qualidade. Mas não é a esses inocentes que eu estou me referindo. É à nossa incrível classe média. Pessoas que além do português utilizam o inglês, principalmente por necessidade profissional.
Ocorre que essas pessoas parece que começam a aprender o inglês sem terem sido completamente alfabetizadas em português. O resultado disso é algo que foi muito bem descrito no famoso samba do crioulo doido, do saudoso Sergio Porto (também conhecido como Stanislaw Ponte Preta).
Quem é que já não teve o desprazer de ler um texto mal traduzido do inglês em que a palavra "eventually" foi traduzida erroneamente como "eventualmente". Todos sabemos (ou deveríamos saber) que "eventually" deve ser traduzido como "finalmente". Já "eventualmente" tem um significado bem distinto. Mas, como a grafia das palavras é parecida, os semi-analfabetos que não sabem o significado da palavra "eventualmente" acreditam que seu significado é o mesmo da palavra inglesa.
Isto é uma grande pena pois , por sua origem latina, o português é uma língua muito sofisticada. Já o inglês, é uma língua relativamente "tosca", que para expressar significados mais complexos tomou emprestado um grande número de palavras do latim (mais ou menos 50% das palavras em inglês derivam do latim diretamente ou através do francês). Isto porque as tribos anglo-saxônicas foram civilizadas pelos romanos, que os colonizaram. Agora, por uma grande ironia, estamos sendo recolonizados pelos anglo-saxões.
Quem é que já teve o desprazer de ouvir, numa reunião em alguma grande empresa, alguém utilizar o verbo "performar"? A primeira vez que se presencia isso é bastante chocante, mas depois a gente acaba se conformando. Certas criaturas não se dão ao trabalho de utilizar a palavra correspondente em português: "desempenhar". Mas dá mais status usar um neologismo absurdo derivado do inglês do que a palavra correspondente no nosso idioma.
Os exemplos dessa mistura de ignorância com submissão cultural são incontáveis. Deixo esse tópico à disposição dos que quiserem compartilhar suas experiências e opiniões a respeito deste tema, incluindo casos de traduções bizarras e outras atrocidades com nosso idioma.




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cassiosemasas
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Re: A destruição de um idioma

#2 Mensagem por cassiosemasas » Dom Dez 06, 2015 12:59 am

JT8D escreveu:Os exemplos dessa mistura de ignorância com submissão cultural são incontáveis.
Concordo contigo, porém a coisa está mudando, não na velocidade que gostaríamos, mas esta rolando.
O que me deixa puto com isso é justamente a submissão, pois quanto a ignorância já melhoramos bastante.(Não o suficiente, mas tivemos avanços significativos.)
Mas a submissão é foda, basta ver o comportamento dos nossos jovens
nas redes sociais, não tem problema curtir, gostar, usufruir,se divertir, com os gringos, o que me deixa fulo é a total "desconciência" dessa grande massa sobre o que é produzido no país.




...
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Re: A destruição de um idioma

#3 Mensagem por Marechal-do-ar » Dom Dez 06, 2015 1:09 am

Auxiliei em algumas traduções técnicas, respondo baseado em algumas experiências.
JT8D escreveu: Quem é que já não teve o desprazer de ler um texto mal traduzido do inglês em que a palavra "eventually" foi traduzida erroneamente como "eventualmente". Todos sabemos (ou deveríamos saber) que "eventually" deve ser traduzido como "finalmente". Já "eventualmente" tem um significado bem distinto. Mas, como a grafia das palavras é parecida, os semi-analfabetos que não sabem o significado da palavra "eventualmente" acreditam que seu significado é o mesmo da palavra inglesa.
Um ótimo exemplo de expressão comum na língua inglesa e pouco comum ou inexistente no português, geralmente, quando "eventually" é usado não é com o mesmo significado de "finally", apesar de serem sinônimos no dicionário, por exemplo:
an infinite number of monkeys with an infinite number of typewriters and an infinite amount of time could eventually write the works of Shakespeare.
Traduza a frase, nesse caso traduzir "eventually" para "finalmente" daria a entender que esse era o objetivo dos macacos, e não que foi apenas um acidente.
JT8D escreveu:Isto é uma grande pena, por sua origem latina, é uma língua muito sofisticada. Já o inglês, é uma língua relativamente "tosca", que para expressar significados mais complexos tomou emprestado um grande número de palavras do latim (mais ou menos 50% das palavras em inglês derivam do latim diretamente através do francês). Isto porque as tribos anglo-saxônicas foram civilizadas pelos romanos, que os colonizaram. Agora, por uma grande ironia, estamos sendo recolonizados pelos anglo-saxões.
A questão é, para muitas coisas, simplesmente não existe uma palavra em português, a produção científica e tecnológica dos países que falam português é praticamente zero, depois de alguns séculos nessa condição o resultado é que precisamos importar palavras para falar sobre as novas coisas que eles criaram.
JT8D escreveu:Quem é que já teve o desprazer de ouvir, numa reunião em alguma grande empresa, alguém utilizar o verbo "performar"? A primeira vez que se presencia isso é bastante chocante, mas depois a gente acaba se conformando. Certas criaturas não se dão ao trabalho de utilizar a palavra correspondente em português: "desempenhar". Mas dá mais status usar um neologismo absurdo derivado do inglês do que a palavra correspondente no nosso idioma.
Felizmente não, mas já tive que utilizar a palavra "performance" e criar variações dela, a nossa palavra possui algumas limitações.




"Quando um rico rouba, vira ministro" (Lula, 1988)
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Re: A destruição de um idioma

#4 Mensagem por Bourne » Dom Dez 06, 2015 1:22 am

O problema é que toda a produção cientifica e técnica do mundo está inglês. Partindo de autores coreanos, japoneses, chineses, árabes, alemães e de todo tipo de idioma. O que é muito bom na medida em que facilita a compreensão e disseminação dos trabalhos.

Usar os termos mundiais na área é algo em quase toda área. A tradução não existe ou é tão horrível e ninguém entende.




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Re: A destruição de um idioma

#5 Mensagem por LeandroGCard » Dom Dez 06, 2015 9:31 am

Bourne escreveu:O problema é que toda a produção cientifica e técnica do mundo está inglês. Partindo de autores coreanos, japoneses, chineses, árabes, alemães e de todo tipo de idioma. O que é muito bom na medida em que facilita a compreensão e disseminação dos trabalhos.

Usar os termos mundiais na área é algo em quase toda área. A tradução não existe ou é tão horrível e ninguém entende.
E este uso de uma língua franca não é novidade e nem começou com o inglês.

No oriente médio antigo a língua aramaica tinha este papel, a ponto de populações inteiras abandonarem sua língua para usá-lo (como muitos dos judeus ao tempo de Jesus, inclusive ele próprio). Depois, na antiguidade clássica, este papel foi do Latim romano. No renascimento o italiano era a língua franca de boa parte da Europa, papel depois assumido pelo francês ao tempo de Napoleão. E com a expansão britânica e depois a ascensão americana a língua franca atual é o inglês.


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Re: A destruição de um idioma

#6 Mensagem por JT8D » Dom Dez 06, 2015 10:31 am

LeandroGCard escreveu:
Bourne escreveu:O problema é que toda a produção cientifica e técnica do mundo está inglês. Partindo de autores coreanos, japoneses, chineses, árabes, alemães e de todo tipo de idioma. O que é muito bom na medida em que facilita a compreensão e disseminação dos trabalhos.

Usar os termos mundiais na área é algo em quase toda área. A tradução não existe ou é tão horrível e ninguém entende.
E este uso de uma língua franca não é novidade e nem começou com o inglês.

No oriente médio antigo a língua aramaica tinha este papel, a ponto de populações inteiras abandonarem sua língua para usá-lo (como muitos dos judeus ao tempo de Jesus, inclusive ele próprio). Depois, na antiguidade clássica, este papel foi do Latim romano. No renascimento o italiano era a língua franca de boa parte da Europa, papel depois assumido pelo francês ao tempo de Napoleão. E com a expansão britânica e depois a ascensão americana a língua franca atual é o inglês.


Leandro G. Card
Como disse, não sou sou um saudosista lutando contra a realidade. Vamos usar o inglês por sua conveniência na comunicação global. Mas não precisamos deformar o português nesse processo. Países de lingua espanhola e mesmo nossos irmãos portugueses são mais cuidadosos nessa questão.
Abs,

JT




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Re: A destruição de um idioma

#7 Mensagem por JT8D » Dom Dez 06, 2015 10:44 am

Marechal-do-ar escreveu:Auxiliei em algumas traduções técnicas, respondo baseado em algumas experiências.
JT8D escreveu: Quem é que já não teve o desprazer de ler um texto mal traduzido do inglês em que a palavra "eventually" foi traduzida erroneamente como "eventualmente". Todos sabemos (ou deveríamos saber) que "eventually" deve ser traduzido como "finalmente". Já "eventualmente" tem um significado bem distinto. Mas, como a grafia das palavras é parecida, os semi-analfabetos que não sabem o significado da palavra "eventualmente" acreditam que seu significado é o mesmo da palavra inglesa.
Um ótimo exemplo de expressão comum na língua inglesa e pouco comum ou inexistente no português, geralmente, quando "eventually" é usado não é com o mesmo significado de "finally", apesar de serem sinônimos no dicionário, por exemplo:
an infinite number of monkeys with an infinite number of typewriters and an infinite amount of time could eventually write the works of Shakespeare.
Traduza a frase, nesse caso traduzir "eventually" para "finalmente" daria a entender que esse era o objetivo dos macacos, e não que foi apenas um acidente.
JT8D escreveu:Isto é uma grande pena, por sua origem latina, é uma língua muito sofisticada. Já o inglês, é uma língua relativamente "tosca", que para expressar significados mais complexos tomou emprestado um grande número de palavras do latim (mais ou menos 50% das palavras em inglês derivam do latim diretamente através do francês). Isto porque as tribos anglo-saxônicas foram civilizadas pelos romanos, que os colonizaram. Agora, por uma grande ironia, estamos sendo recolonizados pelos anglo-saxões.
A questão é, para muitas coisas, simplesmente não existe uma palavra em português, a produção científica e tecnológica dos países que falam português é praticamente zero, depois de alguns séculos nessa condição o resultado é que precisamos importar palavras para falar sobre as novas coisas que eles criaram.
JT8D escreveu:Quem é que já teve o desprazer de ouvir, numa reunião em alguma grande empresa, alguém utilizar o verbo "performar"? A primeira vez que se presencia isso é bastante chocante, mas depois a gente acaba se conformando. Certas criaturas não se dão ao trabalho de utilizar a palavra correspondente em português: "desempenhar". Mas dá mais status usar um neologismo absurdo derivado do inglês do que a palavra correspondente no nosso idioma.
Felizmente não, mas já tive que utilizar a palavra "performance" e criar variações dela, a nossa palavra possui algumas limitações.
Sei que em geral as palavras não tem correspondência exata e "eventually" é um bom exemplo. Mas ao contrário de você, que conhece e se preocupa com essas sutis diferenças de significado, o que observo é que muitos tradutores traduzem sempre e de forma automática "eventually" como "eventualmente".
Acho justificável fazer "adaptações" no caso de palavras que não tem correspondência nem mesmo remota com algum termo em português. Mas não é isto que me incomoda, e sim a alteração do sentido de palavras em português em função do sentido de seu falso cognato em inglês. Por exemplo, já vi muitas vezes usarem a palavra "realizar" ("ele realizou") com o significado do inglês "realize" ("he realized"). Sabemos que "realizar" e "realize" não tem o mesmo significado, já que o correspondente em português da palavra inglesa seria alguma coisa como "perceber" ou "se dar conta de".
Abs,

JT




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Re: A destruição de um idioma

#8 Mensagem por JT8D » Dom Dez 06, 2015 10:47 am

Bourne escreveu:O problema é que toda a produção cientifica e técnica do mundo está inglês. Partindo de autores coreanos, japoneses, chineses, árabes, alemães e de todo tipo de idioma. O que é muito bom na medida em que facilita a compreensão e disseminação dos trabalhos.

Usar os termos mundiais na área é algo em quase toda área. A tradução não existe ou é tão horrível e ninguém entende.
Concordo. Mas não estou falando desses casos, e sim de deformidades como "performar" em que existem ótimas opções de tradução mas a pessoa não se dá ao trabalho de procurar a palavra correspondente em português apenas por preguiça mental.
Abs,

JT




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Re: A destruição de um idioma

#9 Mensagem por JT8D » Dom Dez 06, 2015 10:51 am

cassiosemasas escreveu:
JT8D escreveu:Os exemplos dessa mistura de ignorância com submissão cultural são incontáveis.
Concordo contigo, porém a coisa está mudando, não na velocidade que gostaríamos, mas esta rolando.
O que me deixa puto com isso é justamente a submissão, pois quanto a ignorância já melhoramos bastante.(Não o suficiente, mas tivemos avanços significativos.)
Mas a submissão é foda, basta ver o comportamento dos nossos jovens
nas redes sociais, não tem problema curtir, gostar, usufruir,se divertir, com os gringos, o que me deixa fulo é a total "desconciência" dessa grande massa sobre o que é produzido no país.
A língua é uma importante expressão da cultura de um povo e mesmo de sua identidade. É por isso, por exemplo, que catalães e bascos na Espanha mantém vivos seus idiomas. Eles sabem que o dia em que esses idiomas morrerem sua identidade cultural também desaparecerá.
Abs,

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Re: A destruição de um idioma

#10 Mensagem por JT8D » Dom Dez 06, 2015 11:01 am

A destruição do idioma não ocorre apenas pela incorporação de traduções erradas de outros idiomas. A mera preguiça de procurar o significado de uma palavra no dicionário já causa grandes estragos. Um exemplo típico é a deturpação do significado da palavra "assertivo". É comum as pessoas usarem esta palavra no sentido de "certeiro" ou "preciso" e acharem que estão falando bonito. Todos sabemos, ou deveríamos saber, que "assertivo" não tem nada a ver com "acertar". Embora o som da palavra sugira essa correlação de significados, "assertivo" quer dizer algo como "incisivo" ou "afirmativo". Ou seja, usando "assertivo" como sendo "certeiro" você estará sendo "errativo" :mrgreen:
Abs,

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Re: A destruição de um idioma

#11 Mensagem por JT8D » Dom Dez 06, 2015 1:31 pm

Há uns tempos atrás estava lendo o livro "Engenheiros da vitória" de Paul Kennedy e lá pelas tantas começa-se do nada a falar de um certo "rei". É o rei isso, o rei aquilo, sendo que não havia nenhum rei na história. Voltei às páginas anteriores para ver se tinha perdido alguma coisa e aí me dei conta do que estava acontecendo. Num dado momento o autor começa a falar de um tal "Almirante King", que era o almirante americano responsável pela defesa contra os submarinos alemães no teatro do Atlântico. Pois não é que a partir de um ponto começaram a traduzir "King" (o nome do almirante) por "rei" !!! Isso só pode ter acontecido porque deve ter sido usado algum tradutor automático e ninguém se deu nem ao trabalho de ler o que o software estava cuspindo. Havia mais uma série de erros grosseiros de tradução e fiquei tão indignado que escrevi um email para a editora. Não obtive qualquer resposta, sequer um pedido de desculpas. Imagino que devam ter corrigido essas barbaridades nas edições posteriores, mas eu li o livro até o fim só de raiva e depois o joguei fora.
Abs,

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Re: A destruição de um idioma

#12 Mensagem por Marechal-do-ar » Dom Dez 06, 2015 3:26 pm

JT8D escreveu:Acho justificável fazer "adaptações" no caso de palavras que não tem correspondência nem mesmo remota com algum termo em português. Mas não é isto que me incomoda, e sim a alteração do sentido de palavras em português em função do sentido de seu falso cognato em inglês. Por exemplo, já vi muitas vezes usarem a palavra "realizar" ("ele realizou") com o significado do inglês "realize" ("he realized"). Sabemos que "realizar" e "realize" não tem o mesmo significado, já que o correspondente em português da palavra inglesa seria alguma coisa como "perceber" ou "se dar conta de".
Mais uma para o seu repertório muito comum no mercado financeiro "realização de lucros".
JT8D escreveu:Há uns tempos atrás estava lendo o livro "Engenheiros da vitória" de Paul Kennedy e lá pelas tantas começa-se do nada a falar de um certo "rei". É o rei isso, o rei aquilo, sendo que não havia nenhum rei na história. Voltei às páginas anteriores para ver se tinha perdido alguma coisa e aí me dei conta do que estava acontecendo. Num dado momento o autor começa a falar de um tal "Almirante King", que era o almirante americano responsável pela defesa contra os submarinos alemães no teatro do Atlântico. Pois não é que a partir de um ponto começaram a traduzir "King" (o nome do almirante) por "rei" !!! Isso só pode ter acontecido porque deve ter sido usado algum tradutor automático e ninguém se deu nem ao trabalho de ler o que o software estava cuspindo. Havia mais uma série de erros grosseiros de tradução e fiquei tão indignado que escrevi um email para a editora. Não obtive qualquer resposta, sequer um pedido de desculpas. Imagino que devam ter corrigido essas barbaridades nas edições posteriores, mas eu li o livro até o fim só de raiva e depois o joguei fora.
Revisei algumas traduções de profissionais que foram bem pagos e fizeram exatamente isso, claro, que isso só ocorre uma vez, depois ele vai para a lista negra e nunca mais é contratado.

E outro caso não relacionado (ou seria "unrelataded"?) por ter outras motivações, é a empresa do almirante Othon que recebeu 4,5 milhões de reais e entregou o trabalho cuspido do google translator :twisted:




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Re: A destruição de um idioma

#13 Mensagem por Wingate » Dom Dez 06, 2015 3:36 pm

JT8D escreveu:Há uns tempos atrás estava lendo o livro "Engenheiros da vitória" de Paul Kennedy e lá pelas tantas começa-se do nada a falar de um certo "rei". É o rei isso, o rei aquilo, sendo que não havia nenhum rei na história. Voltei às páginas anteriores para ver se tinha perdido alguma coisa e aí me dei conta do que estava acontecendo. Num dado momento o autor começa a falar de um tal "Almirante King", que era o almirante americano responsável pela defesa contra os submarinos alemães no teatro do Atlântico. Pois não é que a partir de um ponto começaram a traduzir "King" (o nome do almirante) por "rei" !!! Isso só pode ter acontecido porque deve ter sido usado algum tradutor automático e ninguém se deu nem ao trabalho de ler o que o software estava cuspindo. Havia mais uma série de erros grosseiros de tradução e fiquei tão indignado que escrevi um email para a editora. Não obtive qualquer resposta, sequer um pedido de desculpas. Imagino que devam ter corrigido essas barbaridades nas edições posteriores, mas eu li o livro até o fim só de raiva e depois o joguei fora.
Abs,

JT
Nobre colega, prepare-se, pois mais absurdos vão aparecer. Tais como traduzir 'Marines" (referindo-se ao Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA) como "marinheiros". "Sten Gun" como "pistola Sten" e outras sandices.

Quanto mais nos distanciamos no tempo desses eventos históricos, mais "traduções" desse tipo vão ocorrer. O ponto é que ninguém quer ler, ninguém quer pesquisar, ninguém se interessa por p** nenhuma! Fazem o trabalho maquinalmente para receber depois. E estragam obras extremamente interessantes com erros crassos. E os Editores, olimpicamente, olham para o outro lado...

Que saudades do General Octávio Alves Velho (para citar um nome) que foi um grande tradutor em história militar, cujas traduções eram primorosas (traduziu obras de Cornelius Ryan, Russel F. Wegley e outros autores, constantes da Biblioteca do Exército).

Uma pena...

SDS,

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Re: A destruição de um idioma

#14 Mensagem por JT8D » Dom Dez 06, 2015 3:55 pm

Marechal-do-ar escreveu:
JT8D escreveu:Acho justificável fazer "adaptações" no caso de palavras que não tem correspondência nem mesmo remota com algum termo em português. Mas não é isto que me incomoda, e sim a alteração do sentido de palavras em português em função do sentido de seu falso cognato em inglês. Por exemplo, já vi muitas vezes usarem a palavra "realizar" ("ele realizou") com o significado do inglês "realize" ("he realized"). Sabemos que "realizar" e "realize" não tem o mesmo significado, já que o correspondente em português da palavra inglesa seria alguma coisa como "perceber" ou "se dar conta de".
Mais uma para o seu repertório muito comum no mercado financeiro "realização de lucros".
JT8D escreveu:Há uns tempos atrás estava lendo o livro "Engenheiros da vitória" de Paul Kennedy e lá pelas tantas começa-se do nada a falar de um certo "rei". É o rei isso, o rei aquilo, sendo que não havia nenhum rei na história. Voltei às páginas anteriores para ver se tinha perdido alguma coisa e aí me dei conta do que estava acontecendo. Num dado momento o autor começa a falar de um tal "Almirante King", que era o almirante americano responsável pela defesa contra os submarinos alemães no teatro do Atlântico. Pois não é que a partir de um ponto começaram a traduzir "King" (o nome do almirante) por "rei" !!! Isso só pode ter acontecido porque deve ter sido usado algum tradutor automático e ninguém se deu nem ao trabalho de ler o que o software estava cuspindo. Havia mais uma série de erros grosseiros de tradução e fiquei tão indignado que escrevi um email para a editora. Não obtive qualquer resposta, sequer um pedido de desculpas. Imagino que devam ter corrigido essas barbaridades nas edições posteriores, mas eu li o livro até o fim só de raiva e depois o joguei fora.
Revisei algumas traduções de profissionais que foram bem pagos e fizeram exatamente isso, claro, que isso só ocorre uma vez, depois ele vai para a lista negra e nunca mais é contratado.

E outro caso não relacionado (ou seria "unrelataded"?) por ter outras motivações, é a empresa do almirante Othon que recebeu 4,5 milhões de reais e entregou o trabalho cuspido do google translator :twisted:
As maiores bobagens são ditas nas reuniões de empresas multinacionais, onde os gerentes falam um dialeto que mistura o inglês com algumas palavras de português errado. Nessas reuniões pode-se ouvir pérolas como "Nesse quarter vamos salvar 10% do budget". Destaque para a tradução de "save" (economizar, nesse contexto) para "salvar". Salve-se quem puder.
Abs,

JT




Editado pela última vez por JT8D em Dom Dez 06, 2015 4:13 pm, em um total de 2 vezes.
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Re: A destruição de um idioma

#15 Mensagem por JT8D » Dom Dez 06, 2015 4:00 pm

Wingate escreveu:
JT8D escreveu:Há uns tempos atrás estava lendo o livro "Engenheiros da vitória" de Paul Kennedy e lá pelas tantas começa-se do nada a falar de um certo "rei". É o rei isso, o rei aquilo, sendo que não havia nenhum rei na história. Voltei às páginas anteriores para ver se tinha perdido alguma coisa e aí me dei conta do que estava acontecendo. Num dado momento o autor começa a falar de um tal "Almirante King", que era o almirante americano responsável pela defesa contra os submarinos alemães no teatro do Atlântico. Pois não é que a partir de um ponto começaram a traduzir "King" (o nome do almirante) por "rei" !!! Isso só pode ter acontecido porque deve ter sido usado algum tradutor automático e ninguém se deu nem ao trabalho de ler o que o software estava cuspindo. Havia mais uma série de erros grosseiros de tradução e fiquei tão indignado que escrevi um email para a editora. Não obtive qualquer resposta, sequer um pedido de desculpas. Imagino que devam ter corrigido essas barbaridades nas edições posteriores, mas eu li o livro até o fim só de raiva e depois o joguei fora.
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Nobre colega, prepare-se, pois mais absurdos vão aparecer. Tais como traduzir 'Marines" (referindo-se ao Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA) como "marinheiros". "Sten Gun" como "pistola Sten" e outras sandices.

Quanto mais nos distanciamos no tempo desses eventos históricos, mais "traduções" desse tipo vão ocorrer. O ponto é que ninguém quer ler, ninguém quer pesquisar, ninguém se interessa por p** nenhuma! Fazem o trabalho maquinalmente para receber depois. E estragam obras extremamente interessantes com erros crassos. E os Editores, olimpicamente, olham para o outro lado...

Que saudades do General Octávio Alves Velho (para citar um nome) que foi um grande tradutor em história militar, cujas traduções eram primorosas (traduziu obras de Cornelius Ryan, Russel F. Wegley e outros autores, constantes da Biblioteca do Exército).

Uma pena...

SDS,

Wingate
É uma pena que isso esteja acontecendo, porque quando você se depara com uma tradução desse nível, perde-se totalmente o prazer da leitura. Eu acho até divertido fazer traduções de textos técnicos ou históricos, mas desconfio que as editoras não estejam interessadas em boas traduções e sim em contratar o serviço pelo menor custo possível.
Abs,

JT




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