Entrevista ao Sr. Cor Tir Inf ‘Cmd’ Raúl Miguel Socorro Folques
Entrevista ao Sr. Coronel Tirocinado de Infantaria, Comando, Raúl Miguel Socorro Folques
Parede, 27 de abril de 2017
Relativamente ao TO da Guiné-Bissau,
P1: Em que período desempenhou funções no TO da Guiné Bissau?
Desde junho de 72 a maio de 74.
P2: Qual a unidade de colocação?
Foi sempre no Batalhão de Comandos.
P3: Que funções desempenhou no TO da Guiné-Bissau?
De 2º Comandante (Cmdt) do Batalhão de Comandos (BatCmds) e depois Cmdt de Batalhão. Estive um ano como Cmdt Bat e o resto como 2º Cmdt.
P4: A nível de hierarquia o BatCmds respondia a quem?
Respondia ao Comando-Chefe.
P5: De que forma o BatCmds se organizava? Em companhias ligeiras ou pesadas?
Os comandos eram companhias ligeiras, as companhias pesadas na vossa nomenclatura são outras. No meu tempo não havia essa distinção. Havia companhias de caçadores ou atiradores, companhias que se transportavam motorizadas e companhias que se transportavam em viaturas de combate de infantaria, chaimites, e depois as viaturas de lagartas M10 americanas que levavam uma secção. As nossas companhias eram companhias ligeiras que iam para as zonas de operações de viatura até próximo da zona de operação, depois progredíamos e desenvolvíamos a pé.
P6: Como estava organizado o BatCmds?
Era formado por 1 CCS, 3 companhias de comandos africanos e 2 companhias de comandos da metrópole. As companhias de comandos africanas eram a 1ª, 2ª e 3ª. As companhias da metrópole eram a 35 e 38. Depois a 35 foi substituída e já no fim a 38 também foi substituída mas na altura do 25 de abril. “O Movimento e Manobra na campanha militar do Teatro de Operações da Guiné-Bissau (1963-1974)"
P7: As companhias de comandos tinham mistura de militares de companhias de afinidade diferentes?
As companhias de africanos só tinham africanos e as companhias da metrópole podiam ter africanos.
P8: O batalhão atuava como um todo?
O batalhão saía como um todo, mas as companhias também eram projetadas isoladamente, sob o comando ou coordenação do batalhão. O batalhão atuava em operações de especial dificuldade.
P9: As unidades de comandos atuavam como força de intervenção das unidades de quadricula?
Em Angola sucedeu, na Guiné não era bem assim. Na Guiné, ia para uma determinada zona, sendo-lhe dada uma missão, um objetivo. Sucedeu mais que uma vez as companhias 35 e 38 serem retiradas ao batalhão e iam reforçar os CAOP/COP, comandos operacionais.
P10: Havia distinção na utilização das companhias africanas para as outras?
Não, eram utilizadas igual.
P11: A organização que o General Spínola introduziu no Teatro foi uma melhoria?
Não sei qual era a anterior, quando cheguei já estava lá o General Spínola. Todos os Cmdts chefes se adaptaram ao Inimigo (In) e a evolução que o In veio a ter. Com os Cmdts chefes ao adaptarem-se ao In, evolui o conceito, evoluiu o dispositivo, mas ao evoluir o dispositivo houve sempre melhorias apesar que o In foi ficando mais forte, especialmente quando começou a utilizar o Strela. Com o Strela, praticamente durante um mês vimo-nos privados de um apoio consistente e fiável de apoio aéreo.
P12: Davam o curso de comandos?
O curso era dado em Fa Mandinga. Quando cheguei estava a 2ª companhia em formação. Depois disso formamos a 3ª e ainda um curso para recompletamentos. “O Movimento e Manobra na campanha militar do Teatro de Operações da Guiné-Bissau (1963-1974)"
P13: As unidades de quadrícula tinham batalhões no terreno e como se materializavam os CAOP?
O COP era comando de major e o CAOP de tenente-coronel ou coronel. O CAOP enquadrava batalhões e o COP um batalhão reforçado (acho que foram utilizados mais para o sul).
P14: Algumas vezes foram criadas zonas de intervenção de Cmdt chefe?
Em Angola foram criadas, na Guiné lembro-me que foi criada na Matina do Boé.
P15: Qual a base doutrinária que seguiu para as operações?
Havia uns livros de capa azul, o Exército na Guerra Subversiva, mas tenho impressão que não eram livros para General, eram mais para Alferes e Tenente ou mesmo Capitão, era um livro para máximo nível companhia, ensinava emboscada, contra emboscada, batidas, golpe de mão. Eram dois ou três volumes. Também era muito bom o Manual do Oficial Miliciano que também era para nível de alferes e tenente.
P16: A projeção do batalhão como um todo era responsabilidade do batalhão ou contavam com apoio externo?
Quando havia deslocamento do batalhão, entravamos em contato com a secção da logística, e normalmente eram movimentos compostos, não só um único movimento. Lembro-me que numa operação fomos de navio de Bissau a Bafatá, depois até Pitche fomos de viatura, eram viaturas civis alugadas, contratadas, com uma escolta militar. Os deslocamentos eram feitos de forma barata. Já em Angola não, os batalhões, as companhias tinham viaturas que chegavam para o pessoal todo. O batalhão não tinha os meios motorizados que haviam em Angola.
P17: Os helicópteros foram utilizados nas operações?
Eram muito utilizados para Heli assaltos e para evacuação. Não haviam tantos helicópteros na Guiné como em Angola e Moçambique mas os suficientes para apoiar uma operação.
P18: Empregavam fumos no âmbito do obscurecimento do campo de batalha?
Não. Por vezes usávamos granadas de fumos para quando o helicóptero aterrava para sinalizar... “O Movimento e Manobra na campanha militar do Teatro de Operações da Guiné-Bissau (1963-1974)"
P19: O batalhão executava ações de mobilidade e de contramobildade?
Nos movimentos mais perigosos era feita a desminagem com picadores que iam à frente. Em movimentos abertos em mata rala ia uma viatura pesada à frente e abria uma picada. Não sei se podemos considerar como contramobilidade os perímetros clandestinos que montávamos para pernoitar. Nos seus acessos para dificultar qualquer abordagem In, armadilhávamos com granadas-armadilhas ou granadas.
P20: Haviam unidades de reconhecimento? Eram atribuídas tarefas de reconhecimento ao batalhão?
Haviam unidades de reconhecimento mas não eram usadas como tal. Na operação mandava-se parar o pessoal para se ir reconhecer à frente mas normalmente não se fazia reconhecimento antes da operação. O reconhecimento aéreo dava informação sobre as bases inimigas. Era conduta, não havia esse planeamento de reconhecimento.
P21: Destas dimensões quais eram as vertidas na OOp?
Dimensões:
1 - Projeção de Forças e Ocupação de Zonas de Reunião
2 - Manobra e Movimentos Táticos
3 - Fogo Direto e Obscurecimento do campo de batalha através do emprego de fumos
4 - Mobilidade e Contramobilidade
5 - Pesquisa de Informação
Colocava-se o que se sabia do In, a articulação de forças e depois a nossa ideia de manobra (por exemplo, a companhia A vai longo deste eixo, a companhia B vai ao longo daquele eixo, a companhia C vai ao longo daquele eixo) e depois uma reserva que se mantinha ou não caso se pudesse empregar ou não.
P22: A nossa Artilharia era usada para obscurecimento do campo de batalha?
Não. Nem levávamos um observador connosco...
P23: Existiam forças não regulares, milícias ou grupos especiais?
Tinham companhias de caçadores nativas, companhias de comandos, 1 destacamento de fuzileiros e havia várias companhias de milícias. Era tudo africano. E havia a polícia administrativa que era africana.
P24: O batalhão só executou operações ofensivas?
Sim. Sempre. O batalhão só executou operações ofensivas. “O Movimento e Manobra na campanha militar do Teatro de Operações da Guiné-Bissau (1963-1974)"
P25: Porquê que de 1963 a 74 a quantidade de militares africanos subiu significativamente?
Aumentou o número de companhias nativas de caçadores de tal maneira que o General Spínola viu-se na necessidade de graduar algum pessoal para comandar estas companhias. Os africanos tinham motivação, combatiam. Contra o PAIGC tinham vinganças, tinham sido maltratados, eles tinham motivação. Por outro lado como combatentes das nossas forças eram bem alimentados e pagos.
Fonte:
https://comum.rcaap.pt/bitstream/10400. ... 974%29.pdf