Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

Assuntos em discussão: Exército Brasileiro e exércitos estrangeiros, armamentos, equipamentos de exércitos em geral.

Moderadores: J.Ricardo, Conselho de Moderação

Mensagem
Autor
Avatar do usuário
Guerra
Sênior
Sênior
Mensagens: 14202
Registrado em: Dom Abr 27, 2003 10:47 pm
Agradeceram: 135 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#91 Mensagem por Guerra » Sex Jul 24, 2009 9:33 pm

d. As missões das forças de aproveitamento do êxito incluem a conquista de objetivos profundos para cortar as vias de fuga do inimigo e desorganizar suas instalações de comando e de controle e a própria destruição da força inimiga. A missão atribuída ao comandante de uma força de aproveitamento do êxito deve ser suficientemente flexível para permitir que sejam exploradas as oportunidades de desorganizar e destruir o inimigo.

e. A oportunidade para o aproveitamento do êxito pode ser indicada pelo aumento do número de prisioneiros capturados e do material abandonado; pela ultrapassagem de posições de artilharia, de instalações de comando, de comunicações e de depósitos de suprimento do inimigo. Uma vez iniciado, o aproveitamento do êxito deve ser executado ininterruptamente, sem conceder ao inimigo qualquer alívio da pressão ofensiva, até a conquista do objetivo final.

f. As forças de aproveitamento do êxito devem possuir velocidade, grande poder de combate e, sempre que possível, avançar em larga frente. Carros de combate, infantaria blindada e cavalaria mecanizada constituem, normalmente, o escalão avançado de uma força de aproveitamento do êxito. O segundo escalão assegura a flexibilidade, a impulsão e a segurança da operação. Forças aeromóveis e aeroterrestres podem ser empregadas na conquista de objetivos críticos para o avanço e para interromper as vias de retirada do inimigo. As incursões rápidas, os ataques e os desbordamentos realizados por forças terrestres e aeromóveis retardam e impedem a reorganização inimiga. As ações são caracterizadas pela audácia, pelo combate continuado, pela pronta utilização da potência de fogo disponível e pelo emprego rápido e sem hesitação das unidades em segundo escalão.

g. Os esforços de reconhecimento são intensificados no aproveitamento do êxito. A rápida obtenção de informes sobre as atividades e o valor do inimigo, conjugados com os informes sobre o terreno, auxiliam o comandante a tomar as decisões sobre desbordar pequenas resistências inimigas ou modificar o esquema de manobra.

h. O comandante da força de aproveitamento do êxito deve estar alerta para impedir o fracionamento do poder de combate na obtenção de pequenos sucessos locais ou na redução de pequenas forças inimigas. A finalidade é atingir o objetivo com o máximo de poder de combate, tão rápido quanto possível. O controle é essencial para impedir o desdobramento demasiadamente extenso das forças de aproveitamento do êxito, particularmente quando o inimigo for capaz de reagrupar-se rapidamente e constituir-se em séria ameaça. Os fogos disponíveis são empregados para destruir as forças inimigas que não possam ser ultrapassadas ou contidas.

i. A eficiência da operação pode ser aumentada pelo emprego de forças com a missão de seguir e apoiar a força designada para realizar o aproveitamento do êxito. A força de acompanhamento e apoio assume as tarefas que possam retardar o avanço da força de aproveitamento do êxito, tais como: evitar que o inimigo feche as brechas na penetração, manter acidentes capitais conquistados durante o ataque; manter livres as vias de comunicações e de suprimento; destruir resistências inimigas ultrapassadas e substituir elementos da força de aproveitamento do êxito que estejam contendo resistências inimigas desbordadas.

j. Normalmente, a força de acompanhamento e apoio não se subordina à força de aproveitamento do êxito. As relações de comando são semelhantes àquelas do apoio direto de uma unidade de apoio ao combate a outra de combate. Entretanto, elementos da força de acompanhamento e apoio podem reforçar a força de aproveitamento do êxito a fim de, em determinadas situações, assegurar a unidade de comando. As ligações entre os elementos das duas forças devem ser mantidas em todos os escalões. As unidades empregadas como força de acompanhamento e apoio, sempre que possível, devem possuir ou serem providas do mesmo grau de mobilidade da força de aproveitamento do êxito.




A HONESTIDADE É UM PRESENTE MUITO CARO, NÃO ESPERE ISSO DE PESSOAS BARATAS!
Avatar do usuário
Guerra
Sênior
Sênior
Mensagens: 14202
Registrado em: Dom Abr 27, 2003 10:47 pm
Agradeceram: 135 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#92 Mensagem por Guerra » Sex Jul 24, 2009 9:34 pm

PERSEGUIÇÃO

a. A perseguição é a operação destinada a cercar e a destruir uma força inimiga que tenta fugir. Ocorre, normalmente, logo em seguida ao aproveitamento do êxito e difere deste por sua finalidade principal, que é a de completar a destruição da força inimiga que está em processo de desengajamento ou que tenta fugir. Embora um objetivo no terreno possa ser designado, a força inimiga é o seu objetivo principal. Quando o inimigo apresenta indícios de desmoralização e suas forças desintegram-se sob pressão ininterrupta, o aproveitamento do êxito pode transformar-se em perseguição. A perseguição pode também ocorrer em qualquer operação em que o inimigo tenha perdido a capacidade de operar eficientemente e tente desengajar-se do combate. Na perseguição, o inimigo perde sua capacidade de influenciar a situação e age de acordo com as ações da força perseguidora.




A HONESTIDADE É UM PRESENTE MUITO CARO, NÃO ESPERE ISSO DE PESSOAS BARATAS!
Avatar do usuário
Guerra
Sênior
Sênior
Mensagens: 14202
Registrado em: Dom Abr 27, 2003 10:47 pm
Agradeceram: 135 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#93 Mensagem por Guerra » Sex Jul 24, 2009 9:34 pm

Imagem




A HONESTIDADE É UM PRESENTE MUITO CARO, NÃO ESPERE ISSO DE PESSOAS BARATAS!
Avatar do usuário
Guerra
Sênior
Sênior
Mensagens: 14202
Registrado em: Dom Abr 27, 2003 10:47 pm
Agradeceram: 135 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#94 Mensagem por Guerra » Sex Jul 24, 2009 9:35 pm

b. Na execução da perseguição, a força de pressão direta é empregada contra as forças inimigas que se retiram, devendo ser mantida permanentemente. Enquanto isso, a força de cerco corta-lhes as vias de retirada. O duplo desbordamento da força principal inimiga que se retira é executado quando as condições o permitirem. No cerco às forças inimigas, elementos aeromóveis e aeroterrestres devem ser empregados ao máximo.

c. Uma vez ordenada a perseguição, o comandante impulsiona suas forças com todos os meios disponíveis para manter a continuidade da operação. Isto exige que as tropas e o equipamento sejam utilizados até o limite de sua capacidade de resistência, tanto de dia como à noite. O comandante localiza-se bem à frente, para manter o ímpeto do avanço. A força aerotática inflige o máximo de danos ao inimigo em retirada, concentrando-se sobre os pontos críticos ao longo das suas vias de retirada, sobre as colunas que se retiram e sobre as suas reservas. Contramedidas eletrônicas são empregadas para confundir o inimigo, para impedi-lo de utilizar suas redes de comando e controle e para prejudicar suas tentativas de reorganização. A continuidade do apoio logístico é vital para o sucesso da operação.




A HONESTIDADE É UM PRESENTE MUITO CARO, NÃO ESPERE ISSO DE PESSOAS BARATAS!
Avatar do usuário
Guerra
Sênior
Sênior
Mensagens: 14202
Registrado em: Dom Abr 27, 2003 10:47 pm
Agradeceram: 135 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#95 Mensagem por Guerra » Sex Jul 24, 2009 9:35 pm

a seguir...FORMAS DE MANOBRA TÁTICA OFENSIVA




A HONESTIDADE É UM PRESENTE MUITO CARO, NÃO ESPERE ISSO DE PESSOAS BARATAS!
Avatar do usuário
EDSON
Sênior
Sênior
Mensagens: 7303
Registrado em: Sex Fev 16, 2007 4:12 pm
Localização: CURITIBA/PR
Agradeceram: 335 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#96 Mensagem por EDSON » Seg Jul 27, 2009 5:06 pm

Duas pergunta pertinente:


Alguma tropa nossa é especialista em combate urbano? Seria o PQD?




Avatar do usuário
Bolovo
Sênior
Sênior
Mensagens: 28560
Registrado em: Ter Jul 12, 2005 11:31 pm
Agradeceram: 442 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#97 Mensagem por Bolovo » Seg Jul 27, 2009 5:14 pm

EDSON escreveu:Duas pergunta pertinente:


Alguma tropa nossa é especialista em combate urbano? Seria o PQD?
Acho que todas tropas ditas de elite tem treinamento CQB (Close Quarters Battle), mas especialista mesmo em combate urbano acredito que seja a 11ª Bda Inf L, a GLO.




"Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu."
Darcy Ribeiro (1922 - 1997)
Avatar do usuário
Clermont
Sênior
Sênior
Mensagens: 8842
Registrado em: Sáb Abr 26, 2003 11:16 pm
Agradeceram: 644 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#98 Mensagem por Clermont » Seg Jul 27, 2009 5:35 pm

Bolovo escreveu:
EDSON escreveu:Duas pergunta pertinente:


Alguma tropa nossa é especialista em combate urbano? Seria o PQD?
Acho que todas tropas ditas de elite tem treinamento CQB (Close Quarters Battle), mas especialista mesmo em combate urbano acredito que seja a 11ª Bda Inf L, a GLO.
Eu acho que tal especialidade compete à Brigada de Operações Especiais.

Uma vez, perguntei ao Piffer se não seria conveniente que o Brasil tivesse uma tropa e um centro especializado em guerra de rua. E ele explicou que o problema é que, ao contrário da guerra de selva, caatinga ou montanha, que são - é claro - determinadas pela localização geográfica, a guerra de rua pode acontecer... em qualquer rua! Sendo assim, todas as tropas precisam se adestrar, usando recursos locais. Inclusive, porque sairia caro, transportar companhias e batalhões para uma instalação de treinamento de guerra de rua, que fosse centralizada.

Quanto a 11ª Bda, suponho que ela seja especializada em controle de distúrbios. Luta de rua, parece-me, já é um outro departamento. Aliás, pelo que dizem da experiência da guerra no Iraque, parece equivocado considerar tal atividade como prerrogativa exclusiva de infantaria ligeira. Parece que, somente a presença de tanques impede a ocorrência de baixas elevadas nesse tipo de ação.




Avatar do usuário
Guerra
Sênior
Sênior
Mensagens: 14202
Registrado em: Dom Abr 27, 2003 10:47 pm
Agradeceram: 135 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#99 Mensagem por Guerra » Seg Jul 27, 2009 10:06 pm

Clermont escreveu: Uma vez, perguntei ao Piffer se não seria conveniente que o Brasil tivesse uma tropa e um centro especializado em guerra de rua. E ele explicou que o problema é que, ao contrário da guerra de selva, caatinga ou montanha, que são - é claro - determinadas pela localização geográfica, a guerra de rua pode acontecer... em qualquer rua! Sendo assim, todas as tropas precisam se adestrar, usando recursos locais. Inclusive, porque sairia caro, transportar companhias e batalhões para uma instalação de treinamento de guerra de rua, que fosse centralizada.
Toda tropa tem que esta apta a combater em localidade. A prioridade para emprego são de tropas a pé.
Aliás, pelo que dizem da experiência da guerra no Iraque, parece equivocado considerar tal atividade como prerrogativa exclusiva de infantaria ligeira. Parece que, somente a presença de tanques impede a ocorrência de baixas elevadas nesse tipo de ação.
No Iraque as baixas eram o ponto de gravidade da coalisão. Agora imagina o Brasil, com pouquissmo blindados empregando numa batalha num localidade. Pode até acontecer, se essa batalha tiver um peso decisivo na guerra.




A HONESTIDADE É UM PRESENTE MUITO CARO, NÃO ESPERE ISSO DE PESSOAS BARATAS!
Avatar do usuário
Guerra
Sênior
Sênior
Mensagens: 14202
Registrado em: Dom Abr 27, 2003 10:47 pm
Agradeceram: 135 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#100 Mensagem por Guerra » Seg Jul 27, 2009 10:12 pm

Imagem

Nas operações ofensivas, as forças atacantes manobram para obter uma vantagem sobre o inimigo, para cerrar sobre ele e para destrui-lo. O comandante pode empregar cinco formas de manobra tática nas operações ofensivas: desbordamento, envolvimento, penetração, infiltração e ataque frontal.



DESBORDAMENTO

a. Em um desbordamento, o ataque principal ou de desbordamento é dirigido para a conquista de um objetivo à retaguarda do inimigo ou sobre seu flanco, evitando sua principal posição defensiva, cortando seus itinerários de fuga e sujeitando-o ao risco da destruição na própria posição. O desbordamento é executado sobre um flanco vulnerável do inimigo, a fim de evitar o engajamento decisivo com a sua principal força defensiva. Um ou mais ataques secundários fixam o inimigo para impedir seu retraimento e para reduzir sua possibilidade de reagir contra o ataque principal, forçando-o a combater simultaneamente em duas direções. O(s) ataque(s) secundário(s), sempre que possível, deve(m) iludir o inimigo quanto à localização ou à existência do ataque principal.

b. O sucesso do desbordamento depende da surpresa, da mobilidade e da capacidade do(s) ataque(s) secundário(s) para fixar o inimigo. Os meios aéreos são de particular valor para aumentar a mobilidade da força de desbordamento, fornecendo condições para o assalto aeroterrestre ou para o assalto aeromóvel, a fim de facilitar a conquista rápida dos objetivos de desbordamento. Operações desta natureza, em larga escala, podem, na verdade, caracterizar um desbordamento vertical. Quando a situação permitir a escolha da forma de manobra tática, o desbordamento é normalmente preferido à penetração, uma vez que oferece melhor oportunidade para a aplicação do poder de combate com o máximo de vantagens.

c. Uma variante do desbordamento é o duplo desbordamento, onde o ataque procura contornar simultaneamente ambos os flancos do inimigo. Exige uma grande superioridade do poder de combate e de mobilidade e é difícil de ser controlado. A deficiência, em qualquer um desses fatores, pode submeter a força atacante à derrota por partes. A força que executa um duplo desbordamento deve ser capaz de se desdobrar em uma larga frente, contra um inimigo que esteja em uma frente mais estreita, ou que tenha limitada mobilidade.

d. Quando o desbordamento é executado com êxito, configura-se o cerco aproximado. A manobra de cerco caracteriza-se pela conquista e manutenção de regiões que cortam as principais vias de comunicações terrestres por onde o inimigo possa retirar meios ponderáveis ou carrear novos recursos, em tropa ou suprimentos. No cerco aproximado, o espaço de manobra deixado ao inimigo é tão reduzido que, freqüentemente, ele perde a capacidade de reorganizar seus meios e, em conseqüência, de reagir. Esta manobra oferece a melhor possibilidade para a fixação do inimigo na posição e permite sua captura ou destruição. O cerco aproximado é uma manobra de difícil execução, porque requer da força executante uma superioridade numérica e uma mobilidade muito acima do normal. Esta preponderância de forças e maior mobilidade ampliam a ação de surpresa dos elementos que realizam o cerco. O emprego de forças aeroterrestres e aeromóveis aumenta a possibilidade de sucesso nessa forma de manobra tática. Na execução de um cerco é preferível a ocupação de toda a linha de cerco simultaneamente; entretanto, se isso não for possível, as melhores vias de fuga são ocupadas inicialmente. O cerco aproximado é largamente empregado no escalão exército de campanha.




A HONESTIDADE É UM PRESENTE MUITO CARO, NÃO ESPERE ISSO DE PESSOAS BARATAS!
Avatar do usuário
Clermont
Sênior
Sênior
Mensagens: 8842
Registrado em: Sáb Abr 26, 2003 11:16 pm
Agradeceram: 644 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#101 Mensagem por Clermont » Seg Jul 27, 2009 11:08 pm

SGT GUERRA escreveu:No Iraque as baixas eram o ponto de gravidade da coalisão. Agora imagina o Brasil, com pouquissmo blindados empregando numa batalha num localidade. Pode até acontecer, se essa batalha tiver um peso decisivo na guerra.
No antigo Exército Vermelho soviético se dizia que um comandante podia perder homens, sem ter muita preocupação. Mas, se perdesse tanques, ia para o Batalhão Penal.




Avatar do usuário
Clermont
Sênior
Sênior
Mensagens: 8842
Registrado em: Sáb Abr 26, 2003 11:16 pm
Agradeceram: 644 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#102 Mensagem por Clermont » Dom Out 04, 2009 9:07 am

ÚLTIMA SAÍDA ANTES DO ATOLEIRO.

Por William Lind – 22 de setembro de 2009.

O Washington Post, ontem, disponibilizou uma versão não-classificada do há muito aguardado relatório do general Stanley McChrystal sobre a guerra no Afeganistão. Politicamente, o relatório é ousado, ao reconhecer que o inimigo tem a iniciativa e que estivemos travando a guerra – há oito anos – de formas contraproducentes. Mas, intelectualmente, tanto a análise quanto a receita, são cinco gramas de substância numa sacola de 50 Kg.

A mensagem do relatório pode ser resumida numa sentença: precisamos começar a fazer contra-insurgência clássica, e para fazer tal coisa, precisamos de mais “recursos”, isto é, soldados. Num sentido estrito, técnico, esta afirmação é válida. A doutrina clássica da contra-insurgência diz que precisamos de centenas de milhares de soldados a mais no Afeganistão.

Ultrapassando este silogismo, a validade do relatório se torna questionável. Os defeitos começam com a falha do estudo em lidar com a primeira e mais importante questão da Guerra de Quarta Geração: há um estado no Afeganistão? Em certos momentos, o relatório parece presumir que há um estado; em outras partes, fala da fraqueza do estado afegão. Ele nunca lida com o fato principal, ou seja, de que, no presente não há estado, e sob o atual governo afegão não há perspectiva de se criar um.

A falha em reconhecer a ausência de um estado reflete-se no resto do documento. Por exemplo, ele coloca grande ênfase na expansão das Forças de Segurança Nacional Afegãs (Exército e Polícia). Mas, sem estado não há forças armadas estatais. As FSNA constituem-se de milicianos que recebem salário pago por governos estrangeiros, através de intermediários. Quantos pashtun você encontra nas FSNA?

De forma similar, o relatório lamenta que as prisões do Afeganistão se tornaram centros de recrutamento para o Taliban. Ele pede para os Estados Unidos saírem da administração de prisões e entregá-las para o governo afegão. Mas, quem irá, então, controlar estas prisões “estatais”? O Taliban, é claro, justamente como faz agora.

Numa curiosa passagem, o relatório diz, na página 2-20:

Os grandes recursos (que a ISAF exige) não serão suficientes para obter-se o sucesso, mas permitirão a implementação de uma nova estratégia. Por outro lado, recursos inadequados, provavelmente, resultarão em fracasso. Entretanto, sem uma nova estratégia, a missão não deverá receber mais recursos.


Aqui, encontramos a falha mais perigosa do relatório. Ele confunde os níveis de guerra estratégico e operacional. De fato, o relatório não oferece uma nova estratégia, mas um novo plano de nível operacional. A forma como a guerra é travada, isto é, seguindo-se uma doutrina clássica de contra-insurgência, é nível operacional, não estratégico.

A América precisa encontrar uma nova estratégia, já que a atual depende de um estado afegão que não existe. Mas o relatório não oferece nenhuma nova estratégia. O trecho, na página 2-20, termina dizendo, “se vocês não nos derem mais soldados, fracassaremos. Mas, vocês não devem nos dar mais soldados, a não ser que adotemos uma nova estratégia, que nós não temos. E, mesmo se vocês nos derem os soldados que desejamos para a nova estratégia, que nós não temos, eles não vão ser o bastante para obtermos sucesso.” Isto revela total confusão intelectual.

A resposta apropriada da Casa Branca, do Pentágono e do Congresso ao relatório do general McChrystal seria, “de volta para a prancheta, rapazes.”

Como poderia a teoria da Guerra de Quarta Geração nos ajudar a reescrever o relatório? Ao nível operacional, a maioria do que ele recomenda sob a rubrica de contra-insurgência é sólido. Baseando-se no conceito do relatório de “uso apropriado de recursos” que resultem em “risco aceitável e apropriado”, deveríamos concentrar nossos esforços de contra-insurgência numas poucas províncias, tais como Helmand, para mostrar ao Taliban que podemos enfrentá-lo até um impasse. Deveríamos empreender isto, enquanto, gradualmente, rebaixamos o nível de tropas, e não enviando mais delas. O objetivo destas ações, ao nível operacional, seria comprar tempo, tanto no Afeganistão quanto na frente doméstica.

Usaríamos este tempo para implementar uma estratégia, genuinamente nova. Ela deveria procecer dos seguintes fatos:

- Não há estado no Afeganistão, e nenhum pode ser criado pelo ou para o atual governo afegão.

- Nosso objetivo estratégico, como o relatório do general McChrystal salienta em seu primeiro parágrafo, é impedir a volta da al Qaeda ao Afeganistão.

- Atualmente, não há nenhuma evidência da presença da al Qaeda no Afeganistão. Uma das melhores fontes abertas de inteligência, Nightwatch, recentemente, declarou isto, diretamente, e o relatório do general McChrystal dá a perceber isto.

Nosso objetivo estratégico deveria ser a criação de um estado no Afeganistão que possa e vá impedir a volta da al Qaeda. Quem pode fazer isto? O Taliban. Deveríamos usar o tempo ganho pelas operações de contra-insurgência para negociar com o Taliban, a Rede Haqqani, o Hezb-e Islami Gulbuddin e outras lideranças afegãs, incluindo algumas no atual governo afegão, para um arranjo de partilha do poder. Um governo que inclua o Taliban pode criar um estado.

O risco é a falta de vontade do Taliban em manter a al Qaeda de fora. Por quê deveria o mulá Omar concordar com isto? Porque a al Qaeda não precisa mais das bases afegãs. Ela tem outras, de longe, mais úteis no Paquistão. Por isto ela não está, agora, no Afeganistão.

Se o presidente Obama e o Congresso aceitarem o relatório do general McChrystal e adotarem um novo plano operacional em apoio da atual estratégia de construir um estado afegão, em volta do regime, hoje em Cabul, eles garantirão uma derrota americana. Mandar mais tropas irá, somente, maximizar a derrota. Ironicamente, o que Washington precisa é seguir a própria recomendação do general McChrystal e recusar mais recursos sem uma nova estratégia.

Esperemos que os políticos percebam que esta é sua última saída antes de um atoleiro sem fundo.




Avatar do usuário
cabeça de martelo
Sênior
Sênior
Mensagens: 38219
Registrado em: Sex Out 21, 2005 10:45 am
Localização: Portugal
Agradeceram: 2649 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#103 Mensagem por cabeça de martelo » Qui Out 15, 2009 8:20 am

Aeromecanização:
Desafio para a Transformação de Forças. O caso do Equipamento


:arrow: http://www.revistamilitar.pt/modules/ar ... php?id=233

Um artigo muito interessante onde se pode ver as diferenças nos vários conceitos e os casos práticos relacionados com esses mesmos conceitos.




"Lá nos confins da Península Ibérica, existe um povo que não governa nem se deixa governar ”, Caio Júlio César, líder Militar Romano".

Portugal está morto e enterrado!!!

https://i.postimg.cc/QdsVdRtD/exwqs.jpg
Piffer
Sênior
Sênior
Mensagens: 1930
Registrado em: Qui Fev 16, 2006 11:07 pm
Agradeceram: 1 vez

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#104 Mensagem por Piffer » Qui Out 15, 2009 8:39 am

Alguém conhece esse serviço (Nightwatch) que foi citado no post do Clermont?

http://www.afcea.org/mission/intel/nightwatch.asp

Eu me inscrevi no RSS deles para acompanhar por algum tempo e ver como é.

Abraços,




Carpe noctem!
Avatar do usuário
Clermont
Sênior
Sênior
Mensagens: 8842
Registrado em: Sáb Abr 26, 2003 11:16 pm
Agradeceram: 644 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#105 Mensagem por Clermont » Sáb Nov 14, 2009 6:53 pm

PORQUE O REFORÇO AFEGÃO IRÁ FALHAR.

Por Conn Hallinan, 14 de novembro de 2009.

Antes que a administração Obama compre a estratégia de escalada do general Stanley McChrystal, poderia passar algum tempo examinando o combate de Dananeh em 12 de agosto, uma inóspita comuna de 2 mil habitantes, encarapitada na entrada do vale de Naw Zad, na província sulista de Helmand, Afeganistão.

Dananeh é um exemplo de manual do por quê a contra-insurgência não irá funcionar neste país, tanto como um estudo sobre pensamento militar se originando direto de Alice no País das Maravilhas de Lewis Carrol.

Cidades estratégicas.

De acordo com o comando americano, o propósito do ataque era tomar uma cidade “estratégica”, cortar as “linhas de suprimento do Taliban”, e assegurar a área para as eleições presidenciais. Tomar Dananeh também “flanquearia os insurgentes”, “isolando-os” nas montanhas e florestas circunvizinhas.

O que há de errado com este cenário?

Primeiro, o conceito de uma cidade “estratégica” com 2 mil pessoas, num vasto país com dezenas de milhares de aldeias como Dananeh é bizarro.

Segundo, os Talibans não tem “flancos”. Eles são uma força irregular, fluída, não uma companhia de infantaria enterrada numa posição fixa. “Flanquear” um inimigo é algo que você fazia contra a Wehrmacht na Segunda Guerra Mundial.

Terceiro, as “linhas de suprimento do Taliban” não são auto-estradas e cruzamentos ferroviários. São trilhas de cabras.

Quarto, “isolar” o Taliban nas montanhas e florestas circunvizinhas? Obviamente, ninguém no Pentágono parece ter notado que isto seria o equivalente a jogar o coelho Pernalonga dentro de um depósito de cenouras. Montanhas e florestas são onde o Taliban se movimenta mais livremente.

O Taliban também não ficou nem um tiquinho surpreso quando os americanos apareceram. Quando os Fuzileiros Navais executaram seu assalto aeromóvel, tudo estava quieto. Ao alvorecer – o Taliban não tem equipamento de luta noturna – os insurgentes abriram fogo com foguetes, morteiros e metralhadoras. “Estou convencido de que eles sabiam do ataque, antecipadamente,” o comandante da Companhia de Fuzileiros Navais “Golf”, capitão Zachary Martin disse à Associated Press.

Aferrados, os navais pediram apoio aéreo e de artilharia, e, depois de quatro dias de feroz combate, tomaram a cidade. Mas o Taliban tinha partido, furtivamente, na terceira noite. O resultado? Uma vila maltratada e 12 insurgentes mortos – isto é, se você não fizer diferença entre um “insurgente” e um morador que não conseguiu sair à tempo, portanto todos os mortos são, automaticamente, membros do Taliban.

“Eu diria que ganhamos um ponto de apoio por enquanto, e um substancial que não iremos deixar escapar,” disse Martin, “Eu acho que isto tem o potencial de ser uma divisor de águas.”

Somente se alucinações se tornarem a ordem do dia.

Guerra Irregular.

O combate de Dananeh foi um exemplo clássico de guerra irregular. Os locais deram a dica para os guerrilheiros de que o inimigo estava vindo. O Taliban preparou uma emboscada, lutando até que o pesado poder de fogo chegasse, então, escorregando para longe.

“Os combatentes talibans e seus comandantes escaparam da grande ofensiva dos Fuzileiros Navais na província de Helmand e moveram-se para norte e oeste, levantando temores de que o esforço americano, simplesmente, empurrou o problema Taliban para alhures,” escreve Nancy Youssef, do jornal McClatch.

Quando o Taliban rumou para o norte, atacou tropas alemãs e italianas.

Em resumo, a insurgência está se ajustando. “Para muitos americanos, parece como se os insurgentes tivessem cursado algo semelhante à Escola Ranger do Exército dos Estados Unidos, que ensina soldados a como combaterem em pequenos grupos, em ambientes austeros,” escreve Karen DeYoung, no Washington Post.

Na verdade, os afegãos já estão fazendo isto, há algum tempo, como os gregos, mongóis, britânicos e russos já descobriram.

Uma autoridade do Pentágono disse ao Post que o Taliban está usando o Vale do Korengal, que bordeja o Paquistão, como campo de treinamento. Ele é “um perfeito laboratório para combatentes veteranos estudarem as táticas americanas,” ele disse, e para aprenderem como avaliarem, precisamente, o tempo de resposta para os ataques americanos de artilharia, aéreos e de helicópteros. “Eles sabem, exatamente, quanto tempo eles tem antes de precisarem romper contato e recuarem.”

Igual ao que fizeram em Dananeh.

O Plano McChrystal.

O general McChrystal pediu por mais 40 mil novos soldados de modo a manter as “grandes” cidades e proteger a população do Taliban. Porém, mesmo por seus próprios parâmetros, o plano é, profundamente, deficiente. O Manual de Campanha de Contra-insurgência recomenda uma proporção de 20 soldados para cada 1 mil habitantes. Já que o Afeganistão tem uma população de um pouco mais de 32 milhões, isto exigiria uma força de 660 mil soldados.

Os Estados Unidos, em breve, terão 68 mil soldados no Afeganistão, mais um reforço de 13 mil soldados de apoio. Se o Pentágono enviar 40 mil soldados adicionais, as forças americanas subirão para 121 mil. Acrescentados a isto, estão 35 mil soldados da OTAN, embora a maioria dos membros da Aliança estejam sob crescente pressão doméstica para retirar seus soldados. McChrystal quer expandir o exército afegão para 240 mil, e há conversas de tentar alcançar 340 mil.

Mesmo com este maior exército afegão, o plano de contra-insurgência estará carente de 150 mil soldados.

Exército afegão?

E, pode-se mesmo contar com o exército afegão? Ele não tem os oficiais e sargentos para comandar 340 mil soldados. E a fórmula de contra-insurgência pede por soldados “treinados”, não apenas “botas” armadas no terreno. De acordo com uma recente análise, mais de 25 % dos recrutas vão embora, todo ano, e o número de unidades treinadas, realmente, tem declinado nos últimos seis meses.

No topo disto, o Afeganistão, realmente, não tem um exército nacional. Se soldados pashtun são desdobrados no norte de fala tajique, serão vistos como ocupantes, e vice-versa para tajiques em áreas pashtun. Se ambos os grupos são desdobrados em seus territórios natais, as pressões de parentesco, certamente, avassalarão qualquer lealdade para com um governo nacional, em particular, um tão corrupto e impopular quanto o atual regime Karzai.

E, ao defender as cidades, exatamente quem as tropas americanas estarão protegendo? Quando se trata de Afeganistão, “grandes” centros populacionais são quase uma contradição em termos. Há, essencialmente, cinco cidades no país, Cabul (2,5 milhões), Kandahar (331 mil), Mazar-e-Sharif (200 mil), Herat (272 mil) e Jalalabad (20 mil). Estas cinco cidades constituem um pouco mais de 10 % da população, mais da metade da qual está centrada em Cabul. O resto da população é rural, vivendo em comunas de 1500 ou menos, menores até mesmo que Dananeh.

Mas, dispersando as tropas em pequenas bases de fogo as tornam extremamente vulneráveis, como os Estados Unidos descobriram no início de setembro, quando oito soldados foram mortos num ataque contra uma pequena unidade no distrito de Kamdesh da província do Nuristão. A base foi abandonada uma semana depois e, de acordo com o Asia Times, agora está sob o controle do Taliban.

O ataque dos “Stryker”.

Enquanto McChrystal afirma desejar que os soldados saiam das “viaturas blindadas” e andem nas ruas com o povo, os americanos terão de utilizar patrulhas para manter presença fora das cidades. Ocasionalmente, isto pode virar quase uma comédia. Peguem o comboio de viaturas blindadas sobre rodas “Stryker” que saiu em 12 de outubro da “Base de Operações Avançadas” de Spin Boldak na província de Kandahar para o que foi descrito como “missão de alto-risco em território não registrado”.

O comboio era liderado pela nova viatura “Resistente à Minas e Protegida contra Emboscadas” (MRAP, Mine Resistant Ambush Protected), desenhada para resistir à arma de escolha dos insurgentes no Afeganistão, bombas de estrada. Mas o MRAP foi concebido para o Iraque, que tem um monte de boas estradas. Já no Afeganistão que, virtualmente, não tem estradas, o MRAP enguiçou. Sem ele, os “Stryker” não podiam se mover. A missão de alto-risco terminou defendendo uma posição no deserto durante a noite e rastejando para casa, pela manhã. Eles nunca viram um só insurgente.

Depois disso, o sargento John Belajac observou, “Nem posso imaginar como vai ser quando começarem as chuvas.”

Se você está procurando por uma metáfora para a Guerra do Afeganistão, o comboio de Spin Boldak pode servir para isto.

Ilusões Perigosas.

McChrystal argumenta que a atual situação é “crítica”, e que uma escalada “será decisiva”. Mas, como o ex-analista da Agência de Inteligência de Defesa A.J. Rossmiler diz, a guerra está num impasse. “A insurgência não tem a capacidade para derrotar as forças americanas ou derrubar o governo central do Afeganistão, e as forças americanas não tem a capacidade para dominar a insurgência. Enquanto o suposto objetivo da guerra é negar um santuário para a al-Qaeda, de acordo com a inteligência americana, esta organização tem menos de 100 combatentes no país. E mais, o líder do Taliban, mulá Omar, garante que sua organização não irá interferir com os vizinhos do Afeganistão ou com o Ocidente, o que sugere que os insurgentes tem estado aprendendo sobre diplomacia, também.

A Guerra do Afeganistão só pode ser resolvida com todos os participantes tomando assento e trabalhando num acordo político. Desde que o Taliban já apresentou uma proposta de paz com sete pontos, dificilmente isto será uma tarefa intransponível.

Qualquer coisa mais será uma ilusão perigosa.




Responder