Toyota: acelerador que trava pode fazer empresa ter venda suspensa
Adriana Diniz, Jornal do Brasil
RIO - A decisão do Procon de Minas Gerais, de proibir a venda do Toyota Corolla no estado depois de nove acidentes – um deles com perda total e ferimentos leves na motorista – por problemas com o acelerador do veículo pode levar o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC) do Ministério da Justiça a estender a medida a outros estados, além de exigir um recall de todos os Corolla XEI automático 2009. A Toyota, que nos EUA teve de fazer recall do mesmo veículo por problemas similares, nega o defeito e atribui os incidentes ao uso de acessórios não originais – no caso, um tapete que prenderia a peça. Porém, num dos casos citados no processo do Procon, com dois travamentos, o acessório já tinha sido retirado quando o defeito reapareceu. A montadora diz que “tomará as medidas necessárias que preservem seus direitos”.
O bloqueio em Minas Gerais vigora até que a Toyota substitua os tapetes dos veículos novos e usados, independentemente do ano, “por produtos seguros”, segundo o texto do Procon. No Rio, o promotor Rodrigo Terra informou que o MP depende de uma eventual denúncia local para agir. Mas um dos casos do processo ocorreu na Ponte Rio-Niterói e com uma moradora do Rio.
O problema foi revelado pelo blog do jornalista especializado em automóveis Boris Feldman, de Belo Horizonte. Tendo recebido a denúncia, o deputado Délio Malheiros (PV) a entregou ao DPDC, solicitando providências. De Istambul, o deputado comentou o caso ao JB:
– A montadora deveria ter tido uma atitude pró-ativa de alertar os consumidores – avalia.
Audiências
Malheiros conta que a área de Defesa do Consumidor da Assembléia Legislativa em MG realizou duas audiências públicas, mas a Toyota só foi à segunda. A empresa alegou ter colocado informações no manual do carro e sob o tapete.
– A Toyota não está cumprindo a lei, que diz que ela deve avisar os proprietários pessoalmente e divulgar um comunicado público. É preciso, já que todos estão correndo risco – observa o deputado, acrescentando que ter relatos de ocorrências também no Nordeste.
O subsecretário do Procon-RJ, José Fernandes, afirmou que o caso será analisado, e a empresa, notificada a prestar esclarecimentos. Segundo Fernandes, antes de ações restritivas, o órgão faz avaliações técnicas.
– Não podemos tomar qualquer atitude sem antes apurar o que está ocorrendo. Vamos pedir que a Toyota explique os fatos que levaram o Procon de Minas a adotar a medida – declarou Fernandes, acrescentando que os consumidores precisam denunciar incidentes para que o órgão possa ter embasamento.
Em São Paulo, o Procon afirmou que “o Grupo de Estudos Permanentes de Acidentes de Consumo (GEPAC), irá reunir-se sexta-feira para traçar diretrizes da atuação”. Para a advogada Maria Inês Dolci, da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Pro Teste), a decisão em Minas é muito importante.
– A medida mostra que o poder público está atento, porque os recalls demoram a acontecer, colocando em risco a segurança do consumidor.
Conserto
Advogada do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Maíra Feltrin Alves afirma que o DPDC deveria notificar a empresa para prestar esclarecimentos.
– Mesmo sem recall, o consumidor pode levar seu veículo numa concessionária e pedir o reparo sem ônus. Mas é importante denunciar – ressalta.
Em nota enviada à redação, a Toyota diz que analisou os casos de Minas Gerais e “identificou que o retorno do pedal do acelerador foi afetado pelo mau posicionamento ou instalação incorreta do tapete, assim como pelo uso de tapetes não genuínos, incompatíveis com o projeto do veículo”.
Consumidores exigem explicações da empresa
Localizados pela reportagem do JB em Minas Gerais, os proprietários dos Corollas citados no processo exigem explicações da montadora e questionam a justificativa que receberam. A bancária Patrícia Correa comprou o carro em dezembro de 2008 e dez meses depois, quando chegava em casa, bateu na garagem. Ela conta que tentou frear mas não conseguir dada a grande aceleração repentina do veículo.
Patrícia explica que estava acostumada com o veículo e com a garagem.
– Tenho de parar o carro para abrir o portão e depois costumo dirigir devagar, já que há muitas pilastras. De repente, o veículo ficou muito rápido e o freio não funcionou. Só parou quando bateu de frente – explica.
No impacto, o airbag foi acionado, mas ainda assim ela sofreu algumas escoriações, já que tinha retirado cinto de segurança para abrir o portão. “Esse caso precisa ser esclarecido. Acho estranho o que aconteceu e mereço saber de quem é a culpa”.
O caso da assistente social Noêmia Christine Cordeiro poderia ter sido mais grave. Grávida de nove meses, ela bateu com seu Corolla 2009 quando voltava da revisão regular de trocas de pastilhas e disco de freio. Estava parando o carro em uma vaga a 45 graus na rua, quando, ao acertar a direção, pisou no freio e não teve resposta. Neste momento, conta, o veículo acelerou bruscamente e foi direto no muro em frente.
– Acho que até tive sorte, já que passavam pedestres na calçada, que poderiam ter sido atingidos. Também poderia ter sofrido alguma lesão ou até mesmo ser uma tragédia se tivesse em via de alta velocidade – conta
O veículo de Noêmia está na oficina para consertos e só ficará pronto em 15 dias.
– Meu marido e eu só temos esse carro, ficar sem ele por quase um mês está sendo um transtorno muito grande.
A médica e professora Maria do Carmo Melo conseguiu evitar um acidente quando seu Corolla acelerou e não parou quando o freio foi acionado, nem mesmo com o uso do freio de mão. Ela disse ter sido obrigada a furar um sinal vermelho e entrar em uma avenida com velocidade mais elevada.
– Fiquei preocupada que o carro não parava e cheguei a olhar para qual pedal estava pisando. Não tinha nenhum tapete enrolado. Não aceito a justificativa da montadora – declara Maria do Carmo, que contou ainda ter ido à concessionária, mas que lá os funcionários disseram não ter achado problema algum. Exigiu uma revisão eletrônica e que ainda assim não foi detectado o defeito. Por via das dúvidas, usa pouco o veículo.
– Me sinto insegura. Não confio mais neste carro e já penso em vender, mas antes quero explicações para não passar o problema para outra pessoa – ressalta Maria do Carmo.
No caso do administrador de empresas João Paulo de Sena, a aceleração repentina aconteceu duas vezes. Ele explica que a reação foi colocar o pé embaixo do pedal do acelerador e puxá-lo para cima. O tapete era o original e, depois da segunda vez, a concessionária sugeriu que ele “comprasse um grampo para fixar o tapete”.
– Me adaptei – completa.
Proprietária no Rio quase sofreu acidente na Via Dutra
No Rio de Janeiro, a bióloga Joseli Lannes Vieira, também incluída no processo de Mina Gerais, contou ter sofrido duas vezes com problemas em seu Toyota Corolla SEG automático comprado em 2008. O primeiro susto ocorreu em dezembro do ano passado quando ela trafegava pela Via Dutra.
– Comecei a tremer quando percebi que a aceleração do meu motor passou de duas mil rotações por minuto para cinco mil involuntariamente – lembra Joseli. – Fiz força para frear e desliguei o carro bruscamente.
Segundo ela, o problema voltou a se repetir em março, mesmo depois de o tapete ter sido retirado. Após o novo episódio, ocorrido na Ponte Rio-Niterói, a bióloga decidiu levar o veículo até uma concessionária, onde lhe foi dito que o acionamento do piloto automático foi o responsável pelos problemas.
– Perdi completamente a confiança e não me interesso em trocar de carro, já que posso enfrentar outros problemas – revela. – Lamento não ter confiança em um veículo que custa R$ 80 mil. Não costumo andar a mais de 80 km/h.
Este é o segundo Corolla comprado pela bióloga. O primeiro havia sido adquirido no ano 2000, quando ela não se recorda de ter tido complicações. Mesmo com os recentes acontecimentos, Joseli Lannes confessou que não pretende levar o caso adiante por conta própria, devido ao alto custo.
A decisão de Joseli, de trocar o modelo por um mais atual, também foi lembrada por motoristas ouvidos pela reportagem. O empresário Gustavo Pinheiro, de 28 anos, teme trocar seu Corolla 2005.
– O recall feito nas unidades americanas e a decisão do Procon mineiro me deixam com receio. Por conta do travamento, posso provocar um acidente, tendo prejuízo ou, até mesmo, me ferindo – disse ele.
A equipe do JB visitou quinta-feira várias concessionárias Toyota no Rio. Em uma delas um funcionário que pediu para não ser identificado confirmou que proprietários efetivamente têm reclamado de problemas no acelerador. No entanto, de acordo com funcionários de outras duas assistências técnicas, “as alterações se devem ao uso incorreto dos tapetes”.
– Fazemos eletronicamente o diagnóstico dos carros e nunca encontramos nenhum defeito. O problema é o tapete, que é retirado durante lavagens e não é fixado corretamente com as presilhas depois – frisou um mecânico, sem se identificar.
Fonte: http://jbonline.terra.com.br/pextra/201 ... 046711.asp