Re: Programa de Reaparelhamento da Marinha
Enviado: Ter Dez 17, 2019 5:45 pm
por Lord Nauta
NSS K12 Guillobel
Renato de Almeida Guillobel nasceu no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, no dia 8 de outubro de 1892, filho do almirante José Cândido Guillobel e de Elisa de Almeida Guillobel. Seu pai, além de ter chefiado o Estado-Maior da Armada por duas vezes, foi diretor-geral do Arsenal de Marinha, diretor de navegação e hidrografia, membro do Conselho Naval e ministro do Superior — então Supremo — Tribunal Militar (STM). Seu avô, Joaquim Cândido Guillobel, que chegara ao Brasil em 1809 com a patente de alferes do Exército português, após a Independência, em 1822, transferiu-se para o Exército brasileiro, onde chegou a coronel. Engenheiro e arquiteto, foi também o responsável pela construção do palácio imperial de Petrópolis (RJ). Seu irmão, Lourival de Guillobel, advogado, seguiu a carreira diplomática, chegando a ministro plenipotenciário.
Renato Guillobel iniciou seus estudos em Paris, por ocasião da ida de seu pai para a capital francesa como chefe da Comissão Naval Brasileira para Fiscalização da Construção dos Encouraçados Deodoro e Floriano. Retornou ao Rio de Janeiro em meados de 1900 e continuou os estudos ingressando no ano seguinte no Colégio São Carlos. Após concluir o curso primário, regressou à França em 1903. Nessa época, seu pai fora designado chefe da Comissão de Limites do Brasil com a Bolívia, e teve que deslocar-se para o interior da Amazônia. Em Paris, Renato Guillobel ficou sob a tutela de Jules Turrier, professor do Liceu Sainte Croix, com quem morou e estudou durante quatro anos. Além das aulas que recebeu de Turrier em casa, freqüentou como assistente as aulas dos liceus Sainte Croix e Saint Louis, concluindo em 1907 seu curso secundário. De volta ao Brasil, ingressou, ainda em 1907, na Escola Politécnica e na Escola de Pilotos da Marinha, integrada à Escola Naval, ambas no Rio de Janeiro. No início de 1908, matriculou-se na Escola Naval, concluindo o curso em janeiro de 1911, quando saiu guarda-marinha. Em dezembro desse ano foi promovido a segundo-tenente.
Em abril de 1912, embarcou no navio-escola Benjamim Constant para uma viagem de instrução à Europa, retornando ao Rio em dezembro do mesmo ano, quando foi transferido para o contratorpedeiro Pará. Em maio de 1913, deixou suas funções nesse navio para servir como ajudante na Comissão de Limites do Brasil com o Uruguai.
Em 1914, quando teve início a Primeira Guerra Mundial, serviu em diversos navios, entre os quais o contratorpedeiro Pará, no qual permaneceu no decorrer do ano seguinte. Em fevereiro de 1916, foi promovido a primeiro-tenente, e em agosto seguinte transferido para o encouraçado São Paulo, no qual permaneceu até janeiro de 1917, quando passou a servir no cruzador Rio Grande do Sul. Após a entrada do Brasil na guerra em outubro de 1917, embarcou para Dacar a bordo do Rio Grande do Sul, mas, chegando à capital senegalesa, foi transferido para o cruzador Bahia. Nesse navio, incorporado às forças navais da Tríplice Entente — Inglaterra, França e Rússia —, participou, como encarregado de navegação, de operações de patrulha no oceano Atlântico. Retornando ao Rio em junho de 1919, foi elogiado nominalmente pelo presidente da República, Delfim Moreira, por seu desempenho durante as operações de guerra.
Em julho de 1919, passou a exercer, interinamente, o cargo de ajudante-de-ordens da diretoria da Escola Naval de Guerra, nele permanecendo até janeiro de 1920. Nessa ocasião, já no governo de Epitácio Pessoa, foi designado para o cargo de ajudante do chefe do Estado-Maior da Armada (EMA), mantendo-se na função até abril de 1921, quando foi exonerado a pedido. Matriculou-se em seguida na Escola de Submersíveis e em novembro do mesmo ano foi promovido a capitão-tenente.
Em fevereiro de 1922, após ter concluído o curso de submersíveis, Guillobel foi servir no tênder Ceará, fundeado na baía de Guanabara. Esteve de prontidão nesse barco por ocasião do levante de 5 de julho de 1922 — que deu início às revoltas tenentistas da década de 1920 —, deflagrado no Rio e em Mato Grosso em protesto contra a eleição de Artur Bernardes à presidência da República e as punições impostas pelo governo Epitácio Pessoa aos militares.
No decorrer de 1923, no governo de Artur Bernardes, serviu em três navios: o tênder Cuiabá e os encouraçados Deodoro e São Paulo. No início de 1924, voltou a servir no Cuiabá, no qual esteve de prontidão entre 6 e 28 de julho desse ano, durante a revolta tenentista deflagrada no dia 5 daquele mês em Sergipe, Amazonas e São Paulo. Em setembro de 1924, tendo já os rebeldes paulistas se deslocado para o interior, foi designado para o comando do navio-tanque Novais de Abreu. A bordo desse navio, participou, em novembro, da repressão ao levante do encouraçado São Paulo, movimento liderado pelo tenente Herculino Cascardo em apoio aos revoltosos de 1924.
Em dezembro de 1925, deixou o comando do Novais de Abreu, sendo nomeado ajudante-de-ordens do chefe do Estado-Maior da Armada (EMA). Permaneceu nesse cargo até março de 1929, quando assumiu o comando do torpedeiro Goiás. Deixou este comando em agosto de 1930, para, no mês seguinte, retornar ao cargo de ajudante-de-ordens do chefe do EMA.
Em meados de novembro — após o triunfo do movimento revolucionário de outubro de 1930, que destituiu o presidente Washington Luís e, em 3 de novembro, empossou na chefia do Governo Provisório o líder civil da revolução, Getúlio Vargas —, Renato Guillobel deixou o EMA, assumindo o cargo de ajudante-de-ordens do diretor da Escola de Guerra Naval. Em janeiro de 1931, matriculou-se no curso de comando dessa escola.
Em maio de 1932, foi nomeado comandante da canhoneira Oiapoque, a bordo da qual, por ocasião da Revolução Constitucionalista deflagrada em 9 de julho em São Paulo e Mato Grosso, participou da operação de ocupação militar de Porto Esperança (MS), no rio Paraguai. Nessa região, entre julho e setembro de 1932, travou numerosos combates, com os rebeldes, dos quais capturou duas chatas que levou a reboque de seu navio para a base naval de Ladário, também localizada no rio Paraguai. Ainda em setembro de 1932, foi promovido a capitão-de-corveta e, em outubro, com a rendição dos rebeldes constitucionalistas, deixou o comando do Oiapoque. Em novembro, foi designado secretário militar da Escola de Guerra Naval, cargo que ocupou até janeiro de 1933, quando assumiu as funções de auxiliar de ensino da mesma escola.
Desligado da Escola de Guerra Naval em novembro de 1934, foi nomeado adido naval às embaixadas do Brasil na Argentina, Uruguai e Paraguai. Em 1935, integrou a comissão brasileira na Conferência de Paz realizada em Assunção, no Paraguai, para negociar o final da Guerra do Chaco, entre Paraguai e Bolívia. Na ocasião, propôs que o porto a ser concedido à Bolívia se situasse no rio Paraguai o mais próximo possível do território brasileiro, de modo a não fazer fronteira com o Paraguai, para evitar futuros atritos, e ficasse distante da Argentina, favorecendo comercialmente o Brasil. Sua proposta contudo não foi aprovada. Em fins de 1936, deixou o cargo de adido naval e retornou ao Rio.
Em janeiro de 1937, foi designado comandante do contratorpedeiro Maranhão. Em fevereiro de 1938, já durante o Estado Novo, integrou a comissão que elaborou o estatuto dos militares. Em março deixou o comando do Maranhão, passando a servir na Escola de Guerra Naval como chefe da seção de estratégia, e em maio foi promovido a capitão-de-fragata. Em julho de 1939, pouco antes do início da Segunda Guerra Mundial, integrou uma comissão encarregada de elaborar uma nova ordenança geral para a Marinha de Guerra. Dispensado da Escola de Guerra Naval em janeiro de 1941, foi nomeado diretor da Divisão de Planos do EMA.
Em maio de 1942, deixou suas funções no EMA, passando ao comando do contratorpedeiro Marcílio Dias. Com a entrada do Brasil na guerra em agosto desse ano, seguiu com seu navio para Recife, incorporando-se à Força Naval do Nordeste, que em seguida passou a integrar a 4ª Esquadra norte-americana, que operava no Atlântico Sul. Destacado para a 5ª Divisão de Cruzadores, participou de operações de patrulha oceânica e da escola naval. Em junho de 1944, ainda no comando do Marcílio Dias, foi promovido a capitão-de-mar-e-guerra.
Em agosto de 1944, foi nomeado diretor-geral do Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro. Nesse cargo, promoveu urna série de reformas no arsenal, modernizando suas instalações, adquirindo novos equipamentos e remodelando oficinas.
Em fevereiro de 1946, logo após a posse do general Eurico Gaspar Dutra na presidência da República, foi nomeado pelo ministro da Marinha, almirante Jorge Dodsworth Martins, para a chefia de seu gabinete, deixando a direção do Arsenal de Marinha. Em abril desse mesmo ano, foi promovido a contra-almirante e em seguida nomeado para representar a Marinha na comissão enviada para assistir à posse de Juan Domingo Perón na presidência da Argentina.
Em julho de 1946, retornou à diretoria do Arsenal de Marinha, tendo realizado, na nova gestão, diversos melhoramentos nas instalações do arsenal, entre os quais a construção de um hospital com cem leitos. No final de janeiro de 1951, foi nomeado ministro da Marinha pelo presidente Getúlio Vargas, eleito em outubro de 1950.
Ao assumir a pasta da Marinha, em 1º de fevereiro de 1951, dedicou especial atenção à organização administrativa do ministério, opondo-se ao “sistema mais ou menos ditatorial” que, de acordo com suas Memórias, imperava na administração naval, pois ao ministério cabia um número excessivo de atribuições. Nesse sentido, seu programa administrativo baseou-se na divisão dos poderes navais em dois ramos: um, relacionado ao poder militar, sua organização, seu desenvolvimento e adestramento, a cargo do Estado-Maior da Armada, e outro, de natureza civil, responsável pelos assuntos jurídicos, pelas relações públicas, elaboração orçamentária e logística da produção e pelo movimento financeiro do ministério, a cargo da Secretaria Geral de Marinha. Dessa forma, o chefe do Estado-Maior da Armada e o secretário-geral de Marinha passavam a ser seus dois principais auxiliares, conselheiros na elaboração e executores dos planos de seu ministério, com liberdade de ação.
Ainda em 1951, criou o Centro de Instrução de Oficiais da Reserva da Marinha (CIORM), mais tarde Escola de Formação de Oficiais da Reserva da Marinha (EFORM), possibilitando a constituição de um corpo de oficiais da reserva. Esta medida teve por base a sua experiência na Segunda Guerra Mundial, quando esteve incorporado à 4ª Esquadra americana, onde a maioria da oficialidade era constituída por oficiais da reserva.
Promovido a vice-almirante em fevereiro de 1952, em julho desse ano exerceu interinamente o cargo de ministro da Aeronáutica, na ausência de seu titular, o brigadeiro Nero Moura. No decorrer de 1952, graças a um vultoso empréstimo concedido pelo Banco do Brasil, pôde construir a base naval de Recife, o quartel de fuzileiros navais de Uruguaiana (RS) e parte do Centro de Instrução do Corpo de Fuzileiros Navais da Ilha do Governador, no Rio. Além disso, deu prosseguimento às obras das bases navais de Val-de-Cães, em Belém, de Natal e de Aratu (BA), e iniciou a construção da vila operária na avenida Brasil no Rio, destinada aos operários dos estabelecimentos industriais da Marinha.
Entre setembro e novembro de 1952, foi substituído interinamente no ministério pelo general Ciro do Espírito Santo Cardoso, então ministro da Guerra, devido à viagem que realizou aos Estados Unidos. Em 3 de outubro de 1953, na qualidade de ministro, foi um dos signatários da Lei nº 2.004, relativa à política do petróleo e à criação da Petrobras, estabelecendo o monopólio sobre a pesquisa, lavra, refino e transporte do petróleo. Ainda em outubro de 1953, em resposta a denúncias do deputado federal carioca Breno da Silveira sobre irregularidades no Arsenal de Marinha e em outros setores da administração naval, dirigiu-se à Câmara dos Deputados, onde expôs a seus membros as atividades da Marinha no seus diversos setores. Em julho de 1954, foi promovido a almirante-de-esquadra.
Diante da crise política desencadeada pela notícia do envolvimento de membros da guarda pessoal de Getúlio no atentado da rua Toneleros, no Rio, em 5 de agosto, que resultara na morte do major-aviador Rubens Vaz e causara ferimentos no líder oposicionista Carlos Lacerda, Guillobel reuniu-se no dia 22, no Ministério da Marinha, com os oficiais de seu gabinete e vários almirantes para discutir a situação política e as possíveis conseqüências da crise. Ao mesmo tempo, o ministro da Justiça Tancredo Neves sugeria a Getúlio que prendesse, ainda que para efeito moral, os brigadeiros signatários de uma nota pedindo a renúncia do presidente — distribuída na manhã do mesmo dia —, e solicitasse ao Congresso a implantação do estado de sítio. Essa proposta, no entanto, foi recusada pelos ministros militares sob a alegação de que agravaria ainda mais a crise existente. Na tarde do dia 23, parte do almirantado e dos generais distribuíram um manifesto em apoio aos brigadeiros.
Nessa noite, em reunião do ministério do palácio do Catete, após ter ouvido a explanação do ministro da Guerra, general Euclides Zenóbio da Costa, sobre o agravamento da situação no meio militar — que se refletia no fato de que a maioria dos comandantes de tropa do Exército não acatariam as ordens de ação contra a Força Aérea e a Marinha —, Vargas indagou a cada um dos ministros o que deveria ser feito para solucionar a crise. Na ocasião, Guillobel declarara que, embora estivesse “decidido a acompanhá-lo” na decisão que viesse a tomar, “a maioria dos chefes da Marinha” era contrária ao governo.
Às cinco horas da manhã do dia 24, a reunião foi encerrada por Vargas, que impôs aos ministros militares a manutenção da ordem pública como condição para que apresentasse o pedido de licença, passando a chefia do governo a seu substituto legal, o vice-presidente João Café Filho. Poucas horas depois, foi divulgada a notícia de seu suicídio.
No dia 25 de agosto, Guillobel deixou o Ministério da Marinha, sendo substituído pelo almirante Edmundo Jordão Amorim do Vale, nomeado por Café Filho, e se tornou adido ao gabinete do novo ministro. Em outubro de 1954, foi nomeado presidente do Conselho de Promoções da Marinha.
Em 11 de novembro de 1955, o presidente em exercício Carlos Luz, substituto de Café Filho, que se ausentou do cargo por doença, foi afastado do poder por um movimento militar liderado pelo general Henrique Teixeira Lott, ministro da Guerra demissionário, que visava, segundo seus promotores, a barrar uma conspiração em preparo no governo e assegurar a posse do presidente eleito Juscelino Kubitschek. Nesse mesmo dia, foi empossado na presidência da República o vice-presidente do Senado Nereu Ramos. Formado novo ministério, a pasta da Marinha foi confiada ao almirante Antônio Alves Câmara Júnior. No dia 16 de novembro, Guillobel assumiu a chefia do Estado-Maior da Armada (EMA).
Em janeiro de 1956, convidado pelo ministro Alves Câmara para ocupar a chefia do Estado-Maior das Forças Armadas (EMFA), recusou o cargo alegando sua posição contrária à existência daquele órgão. Segundo afirmou, o EMFA era “uma excrescência prejudicial ao bom andamento e entendimento das forças armadas”, um “órgão inoperante” que deveria “ser substituído pela Junta de Chefes do Estado-Maior”. Com o início do governo de Juscelino Kubitschek, em janeiro de 1956, permaneceu à frente do EMA.
Em junho de 1956, foi nomeado ministro interino da Marinha, devido ao afastamento do titular da pasta por motivo de saúde. Nessa ocasião, retomou as negociações que iniciara em sua gestão como ministro para a compra do porta-aviões Minas Gerais, conseguindo o crédito junto ao Ministério da Fazenda e tratando da documentação necessária para que o empreendimento fosse efetuado logo que o ministro Alves Câmara retornasse ao cargo, o que ocorreu no mês seguinte.
Em maio de 1957, foi designado pelo presidente Kubitschek para chefiar a delegação brasileira enviada à reunião preparatória para o estudo das bases da Organização da Defesa do Atlântico Sul. Em setembro, apresentou uma sugestão que foi acatada pelo ministro da Marinha, no sentido de que emitisse um decreto dando aos antigos ministros o título de conselheiros do almirantado.
Em outubro, atingindo a idade da aposentadoria compulsória, deixou o serviço ativo da Marinha, sendo substituído na chefia do EMA pelo almirante-de-esquadra Gérson de Macedo Soares. Continuou, porém, como conselheiro do almirantado até 1962.
Foi membro da Sociedade Brasileira de Geografia, do Instituto de Geografia Militar e de várias missões diplomáticas. Foi autor de dois inventos adotados pela Marinha brasileira: o marcador de alvos para uso dos submarinos e o determinador de ângulos de tiro para submarinos. Realizou levantamentos hidrográficos e topográficos dos quais derivaram a Carta geográfica de Angra dos Reis a canal da Gipóia, o Mapa da zona fronteiriça de Jaguarão à linha seca de Bajé fronteira Brasil-Uruguai e o Levantamento e mapa das propriedades da Marinha em Friburgo.
Faleceu no Rio de Janeiro no dia 20 de setembro de 1975.
Além de Memórias, publicou Tratado de navegação, Observações para uso dos comandantes de submarinos, Estratégia naval brasileira, O tiro de torpedos, Administração naval, Ressurgimento da aviação naval, Apreciações sobre o EMFA, Aos mortos da Intentona Comunista, A Marinha brasileira na Segunda Guerra Mundial, O almirante Pedro de Frontin, Panorama da guerra nos mares e A marcha da guerra. Publicou também três contos: Experiência, Nicolau Segundo, Manuel dos Reis.