Texto de autoria do General Hamilton Bonat....
http://www.bonat.com.br/2014/08/19/a-es ... ira-latas/
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A esquecida morte de 50 mil vira-latas.
Por que atacar o Brasil, se a disputa era entre Assunção e Buenos Aires, que sufocava a economia paraguaia? Seria esta a pergunta que, se pudesse, eu faria a Francisco Solano López. Vai completar 150 anos que ele mandou aprisionar o vapor Marquês de Olinda e trancafiou sua tripulação e passageiros, entre eles o Presidente da Província de Mato Grosso, que sucumbiriam à fome e aos maus tratos na prisão. Pouco mais tarde, milhares de suas fanatizadas tropas tomariam Forte Coimbra, Dourados, Nioaque, Miranda e Coxim, não sem antes ceifar inúmeras vidas.
López deve ter-se apercebido da nossa fragilidade. Éramos um país dividido. A Corte, centralizadora, e as oligarquias regionais, ávidas por autonomia, olhavam-se com desconfiança. Do Imperador tinham tirado o exército. Fracionaram-no em guardas nacionais, subordinadas aos propósitos da elite escravista. O efetivo terrestre não chegava a 20 mil. López deve ter imaginado que seria presa fácil para os seus 50 mil bravos. Havia, ainda, uma cruel divisão entre homens livres e escravos. Ele confiava na sublevação destes últimos. Não contava, aí o seu erro, com o poder aglutinador e a capacidade de mobilização da Coroa.
Apesar de estarem documentalmente registradas, evidências históricas parecem nada valer para certos autores, que, numa autofagia incompreensível, insistem em atribuir ao Brasil a culpabilidade pela sangrenta guerra que se prolongaria por quase seis anos. Segundo eles, influenciados pelos ingleses, fomos os responsáveis, não só por ela, mas pelo extermínio da população masculina do vizinho país.
Não lembram dos mais de 50 mil brasileiros, a maioria muito jovem, que deixaram suas vidas longe do pedaço de chão onde eram amados. Tratam-nos como vira-latas, termo recorrente em demagógicos discursos de líderes políticos nacionais. O eufemista “complexo de vira-latas”, rotineiramente usado, parece-lhes mais agradável do que afirmar que não somos de nada. A conclusão que se tira disso tudo é que somos realmente vira-latas!
Enquanto nossos irmãos paraguaios enaltecem seus mais de 150 mil mortos, não permitimos que os nossos 50 mil descansem, condenando-os ao fogo eterno. Com sua ideologia, carcomido instrumento de dominação externa, brasileiros tentam impor ideias, que não são deles, mas importadas, baseadas em suposições que mascaram a realidade.
Ainda bem que autores há para desmenti-los. “A Maldita Guerra”, de Francisco Doratioto, é resultado de séria pesquisa e revela inexistir comprovação da industrialização guarani. Seu consumo interno era ínfimo. Portanto, afirmar que a Inglaterra queria abrir mercado, patrocinando uma guerra, é algo totalmente ilógico. A falta de lógica é reforçada quando Doratioto revela que, quando o conflito começou, o Brasil tinha relações rompidas com a Inglaterra.
Passa longe de mim a intenção de defender os ingleses, os donos do mundo de então. Muito menos pretendo elevá-los ao altar, pois santos eles nunca foram. Que o digam os indígenas da América do Norte, ou as vítimas chinesas da guerra do Ópio. Com o tempo, sua influência foi diminuindo, menos por aqui, onde continuam dando as cartas, num jogo de um perdedor só: o vira-lata. Quem dá as cartas são suas organizações ambientalistas, aquelas que agem contra o progresso em todo o mundo, menos, e estranhamente, na Europa Ocidental. Fez bem o senhor Putin ao dar-lhes um “chega prá lá” quando tentaram invadir uma plataforma de petróleo russa. Fazem bem os chineses ao não admitirem sua intromissão em sua cozinha. Mas no território brasileiro elas têm livre trânsito, contando com a cumplicidade de autoridades do alto escalão e, até, de pretendentes a tal. Quantos brasileiros mais irão morrer no trecho da Serra do Cafezal da Régis Bittencourt? Até quando permaneceremos sem a energia da usina de Belo Monte? Até quando durará a nossa submissão? A resposta é simples: até o dia em que deixarmos de ser vira-latas.
Mas até mesmo guerras geram avanços. Após a do Paraguai, o Brasil passaria por sua maior revolução política e social. Antecipou-se o fim de quase 400 anos de escravidão, mancha com que os lusitanos e seus descendentes marcaram a nossa história. Sentindo que iriam perder a mão de obra gratuita, apressaram-se em incentivar, com falsas promessas, a imigração de europeus. Entre outros, chegaram poloneses, ucranianos, suíços, alemães e italianos, gente que nunca escravizou e que passaria a viver aqui em regime de quase escravidão.
Os que mandavam no pedaço não demoraram em alcunhá-los coxas-brancas, com o subliminar intento de taxá-los como racistas. Uma vez mais, invertia-se a realidade. Por não conseguir entender, acrescento mais um vira-lata nessa história: este guaipeca que vos fala.